sábado, 31 de outubro de 2009

Homilia do dia de todos os Santos



Caros irmãos e irmãs a nossa celebração eucarística convida-nos a compartilhar o júbilo celeste dos santos, a saborear a sua alegria. Os santos não são uma exígua casta de eleitos, mas uma multidão inumerável, para a qual a liturgia de hoje nos exorta a levantar o olhar. Eles são uma multidão, não correspondem somente os santos oficialmente reconhecidos, mas os batizados de todas as épocas e nações, que procuraram cumprir com amor e fidelidade a vontade divina.
Nesta solenidade de hoje, a Igreja festeja a sua dignidade de "mãe dos santos, imagem “civita dei" (Agostinho), e manifesta a sua beleza de esposa imaculada de Cristo, nascente e modelo de toda a santidade (Lumem gentium, 48). Não falta santos na Igreja, não obstante existe diversos faltosos e rebeldes. Para Bento XVI “é nos santos que a Igreja reconhece os seus traços característicos, e precisamente neles saboreia a sua glória mais profunda”.
Nesse dia a Igreja militante (aquela que cainha neste mundo) honra a Igreja triunfante do Céu celebrando numa única solenidade todos os Santos. É como diz a oração da pós comunhão da Missa: para que nesta mesa de peregrinos, passemos ao banquete do vosso Reino”. Essa solenidade é para render homenagem aquela multidão de Santos que povoam o Reino dos céus que São João viu no Apocalipse: “Ouvi então o número dos assinalados: cento e quarenta e quatro mil assinalados, de toda tribo dos filhos de Israel… Depois disso, vi uma grande multidão que ninguém podia contar, de toda nação, tribo, povo e língua: conservavam-se em pé diante do trono e diante do Cordeiro, de vestes brancas e palmas na mão,”. Estes eram os sobreviventes da grande tribulação; lavaram as suas vestes e as alvejaram no sangue do Cordeiro.” (cf. Ap 7,4 - 14)
Esta imensa multidão de 144 mil, “que está diante do Cordeiro” compreende todos os servos de Deus, ao qual a Igreja canoniza através da decisão infalível do Papa, e todos aqueles, incontáveis, que conseguiram a salvação, e que desfrutam da visão beatífica de Deus. Este povo compreende os santos do Antigo Testamento, a partir do justo Abel e do fiel Patriarca Abraão, os do Novo Testamento, os numerosos mártires do início do cristianismo e também os beatos e os santos dos séculos seguintes, até as testemunhas de Cristo desta nossa época. Todos eles são irmanados pela vontade de encarnar o Evangelho na sua existência, sob o impulso do eterno animador do Povo de Deus, que é o Espírito Santo.
Mas "para que servem o nosso louvor aos santos, o nosso tributo de glória, esta nossa solenidade?". Com esta interrogação tem início uma famosa homilia de São Bernardo para o dia de Todos os Santos. Ele conclamava seus confrades a imitação dos santos no que corresponde ao desejo de ver a Deus e ficar com Ele. O santo dizia: Bem-aventurados os limpos de coração, e verdadeiramente bem-aventurados, porque eles verão aquela face divina, a qual os anjos sempre estão vendo e sempre estão desejando ver. A vós, Senhor, diz o meu coração: Nenhuma coisa desejo, senão ver-vos de face a face, porque nenhuma outra há para mim, nem na terra nem no mesmo céu. Desmaia o meu coração nas ânsias deste desejo, porque só o Deus do meu coração é o único e todo o bem que o pode satisfazer. E quando chegará aquela ditosa hora em que, com a vista de vosso rosto, fique satisfeito? Mas, ai de mim — diz Bernardo — que pela pouca limpeza de meu coração — quero-o dizer com as suas próprias palavras — ai de mim, que a impureza e imundícia de meu coração impede-me e faz indigno de ser admitido àquela bem-aventurada vista! Ora, Se isto dizia de si um coração tão puro, um coração tão santo, um coração tão elevado, tão estático, tão seráfico e tão abrasado no amor divino, se isto dizia no coração de Bernardo a humildade, que dirá noutros corações a verdade? Se o corpo estiver no claustro, e o coração no mundo? Se o coração, depois de se dar a Deus, estiver sacrificado ao ídolo? Se o coração, que devera estar cheio de caridade e amor de Deus, estiver ardendo em amor que não é caridade? Se as palavras, que saem do coração, e os pensamentos, que não saem, forem envoltos em impureza? Ai de tal coração e de quem o tem. Eis, portanto, o significado da solenidade hodierna: contemplando o exemplo luminoso dos santos, despertar em nós o grande desejo de ser como os santos: felizes por viver próximos de Deus, na sua luz, na grande família dos amigos de Deus. Ser santo significa: viver na intimidade com Deus, viver na sua família. Esta é a vocação de todos nós, reiterada com vigor pelo Concílio Vaticano II, no capítulo V da Lumen gentium.
A mesma “Lúmen gentium” do Vaticano II, lembra que: “Pelo fato de os habitantes do Céu estarem unidos mais intimamente com Cristo, consolidam com mais firmeza na santidade toda a Igreja. Eles não deixam de interceder por nós junto ao Pai, apresentando os méritos que alcançaram na terra pelo único mediador de Deus e dos homens, Cristo Jesus. Por seguinte, pela fraterna solicitude deles, a nossa fraqueza recebe o mais valioso auxílio” (LG 49). Com esta mesma convicção, na hora da morte, S. Domingos de Gusmão dizia a seus frades: “Não choreis! Ser-vos-ei mais útil após a minha morte e ajudar-vos-ei mais eficazmente do que durante a minha vida”. E Santa Teresinha confirmava este ensino dizendo: “Passarei meu céu fazendo bem na terra”.
Mas como alcançar esta tão sonhada santidade dos bem-aventurados? Para ser santo não é necessário realizar ações nem obras extraordinárias, nem possuir carismas excepcionais, nem ser adivinhos e videntes.para ser santo é preciso, sobretudo ouvir Jesus e depois segui-lo sem desanimar diante das dificuldades. "Se alguém me serve Ele admoesta-nos que me siga, e onde Eu estiver, ali estará também o meu servo. Se alguém me servir, o Pai há de honrá-lo" (Jo 12, 26). Quem nele confia e o ama com sinceridade, como o grão de trigo sepultado na terra, aceita morrer para si mesmo. Com efeito, Ele sabe que quem procura conservar a sua vida para si mesmo, perdê-la-á, e quem se entrega, se perde a si mesmo, precisamente assim encontra a própria vida (cf. Jo 12, 24-25).
A experiência da Igreja demonstra que cada forma de santidade, embora siga diferentes percursos, passa sempre pelo caminho da cruz, pelo caminho da renúncia a si mesmo. As biografias dos santos descrevem homens e mulheres que, dóceis aos desígnios divinos, enfrentaram por vezes provações e sofrimentos indescritíveis, perseguições e o martírio. Perseveraram no seu compromisso, "vêm da grande tribulação lê-se no Apocalipse lavaram as suas túnicas e branquearam-nas no sangue do Cordeiro" (Ap 7, 14). Os seus nomes estão inscritos no livro da Vida (cf. Ap 20, 12); a sua morada eterna é o Paraíso. O exemplo dos santos constitui para nós um encorajamento a seguir os mesmos passos, a experimentar a alegria daqueles que confiam em Deus, porque a única verdadeira causa de tristeza e de infelicidade para o homem é o fato de viver longe de Deus.
A santidade exige um esforço constante, mas é possível para todos porque, mais do que uma obra do homem, é sobretudo um dom de Deus, três vezes Santo (cf. Is 6, 3). Na segunda Leitura, o Apóstolo João observa: "Vede que amor tão grande o Pai nos concedeu, a ponto de nos podermos chamar filhos de Deus; e, realmente, o somos!" (1 Jo 3, 1). Portanto, é Deus que nos amou primeiro e, em Jesus, nos tornou seus filhos adotivos. Na nossa vida tudo é dom do seu amor: como permanecer indiferente diante de um mistério tão grande? Como deixar de responder ao amor do Pai celestial, com uma vida de filhos reconhecidos? Em Cristo, entregou-se inteiramente a nós e chama-nos a um profundo relacionamento pessoal com Ele. Portanto, quanto mais imitarmos Jesus e permanecermos unidos a Ele, tanto mais entraremos no mistério da santidade divina.
Assim, o caminho para tudo isso é buscar ardentemente ser um bem-aventurado. Jesus é o Santo principal, é através dele que toda santidade eclesial sustenta seu alicerce. Com efeito, Ele é o verdadeiro pobre de espírito, o aflito, o manso, aquele que tem fome e sede de justiça, o misericordioso, o puro de coração, o pacificador; Ele sofre perseguição por causa da justiça. As Bem-Aventuranças revelam-nos a fisionomia espiritual de Jesus e assim exprimem o seu mistério, o mistério da Morte e da Ressurreição, da Paixão e da alegria da Ressurreição. Este mistério, que é mistério da verdadeira bem-aventurança, convida-nos ao seguimento de Jesus e, deste modo, ao caminho que conduz a ela. Na medida em que aceitamos a sua proposta e nos colocamos no seu seguimento cada qual nas suas próprias circunstâncias também nós podemos participar das Bem-Aventuranças. Juntamente com Ele, o impossível torna-se possível e até um camelo pode passar pelo fundo de uma agulha (cf. Mc 10, 25); com a sua ajuda, somente com a sua ajuda podemos tornar-nos perfeitos como é perfeito o Pai celeste (cf. Mt 5, 48).


Pe. Fantico Nonato Silva Borges, CM

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