sexta-feira, 9 de maio de 2014

As Virtudes Teológicas

As Virtudes

 Virtude é uma disposição habitual e firme para fazer o bem. (CIC)


Como afirma a Igreja, toda pessoa virtuosa vive segundo sua força sensível e espiritual na busca de praticar o bem, porque é praticando as obras boas que iremos nos assemelhar-nos a Deus. Pois assim declara a Escritura: “Deus disse: façamos o homem à nossa imagem, como nossa semelhança...”[1] Esse assemelhar-se é como dizia São Gregório de Nissa: “o objetivo da vida virtuosa” (ver CIC : 1803).  Todo virtuoso segundo os moldes filosóficos aristotélico busca o bem e foge dos vícios.[2]
As virtudes podem ser divididas em dois blocos: as virtudes humanas e as virtudes teologais. As humanas são também chamadas de virtudes cardeais. Para melhor compreensão da exposição falaremos de cada uma e suas características.
As virtudes humanas são, na verdade, atitudes firmes, disposições estáveis, perfeições habituais da inteligência e da vontade que regulam nossos atos.[3] Segundo os ensinamentos da Igreja, uma pessoa é virtuosa quando consegue praticar livremente o bem. Podemos, seguindo esse axioma, afirma que pessoa virtuosa é aquela que diante das opções entre o bem e mal, escolhe livremente aderir àquilo no qual resplandece o Belo, o Bem, o Perfeito.
As virtudes humanas morais são adquiridas humanamente. Elas constituem os frutos de atos moralmente bons. Elas ajudam o homem a comungar do amor divino. Quem é virtuoso age segundo o amor e a força de Deus.
As virtudes cardeais são quatro: a Prudência, a Justiça, a Fortaleza e a Temperança. Todas as outras virtudes humanas se agrupam em torno delas. A prudência, segundo o Catecismo da Igreja Católica, “é a virtude que dispõe a razão prática a discernir em qualquer circunstância nosso verdadeiro bem e a escolher os meios adequados a realizá-lo.”[4]  Escrevia Santo Tomás de Aquino que a prudência é  a regra certa da ação (cf  S. Th. IN CIC, 1806). É ela quem guia o juízo da consciência. A pessoa prudente age, move-se e orienta-se segundo esse juízo consciente.
A justiça “é a virtude moral que consiste na vontade constante e firme de dar a Deus e ao próximo o que lhes é devido.”[5] Essa  justiça para com Deus se chamará de virtude da religião. Para com os homens caracterizar-se-á pelo respeito para com o direito de cada um e a busca de estabelecer relações harmoniosas e fraternas na vivência do bem comum.
A fortaleza “é a virtude moral que dá segurança nas dificuldades, firmeza e Constância na procura do bem.”[6]  A fortaleza ajuda a vencer o medo e a suportar as provações. “No mundo tereis tribulações, mas tende coragem: eu venci o mundo.”[7] A fortaleza é a virtude de quem é justo, pois o justo para defender a justiça precisa ter fortaleza de espírito.
A temperança “é a virtude moral que modera a atração pelos prazeres e procura o equilíbrio no uso dos bens criados.”[8] A virtude da temperança serve como balança de nossa ação, uma ver que, assegura o domínio da vontade sobre os instintos e mantém os desejos dentro dos limites da honestidade. Em outras palavras podemos indagar a virtude da temperança como sendo aquilo que Aristóteles chamou de a “essência da virtude”, isto é, o equilíbrio.[9] A pessoa temperante é acima de tudo uma pessoa equilibrada que sabe orientar bem os seus apetites e vícios.
Essas virtudes humanas que elencamos são adquirida pela educação ou hábito, por meio de atos e práticas constante, mas, que por sua vez são purificados e elevados pela graça divina que atua em nós através do Espírito do Senhor.
As outras categorias de virtudes são denominadas de teologais. São elas: a Fé, a Esperança e a Caridade. As virtudes humanas fundam-se nas teologais, que adaptam as faculdades do homem para participar da natureza divina, uma ver que, as virtudes teologais remetem ao próprio Deus. Segundo o CIC, “as virtudes teologais fundamentam, animam e caracterizam o agir moral do cristão. Informam e vivificam todas as virtudes morais. São infundidas por Deus na alma dos fiéis para serem capazes de agir como seus filhos e merecer a vida eterna. ”[10]  
A fé “é a virtude teologal pela qual cremos em Deus e em tudo que nos disse e revelou, e que a Santa Igreja nos propõe crer, porque ele é a própria verdade.”[11] A fé é uma virtude que para ter sentido pleno precisa imbui-se de atitudes de caridade. Como nos alerta São Tiago: “a fé, se não tiver obras, está morta em seu isolamento”[12] Por isso a fé como virtude teologal é caminho de abertura para a maior das virtudes que é a caridade.
A esperança “é a virtude teologal pela qual desejamos como nossa felicidade o Reino dos céus e a vida eterna, colocando nossa confiança nas promessas de Cristo e apoiando-nos não em nossas forças próprias, mas no socorro da graça do Espírito Santo.”[13] A virtude da esperança aponta para a realização última, por isso ela é resposta às nossas aspirações de felicidade colocadas por Deus em nosso coração.  A esperança é a virtude que nos ajuda a suportar com amor e paciência as provações da vida. Ela é a “âncora da alma” e sustento na tribulação.
A caridade “é a virtude teologal pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas, por si mesmo, e ao próximo como a nós mesmos, por amor de Deus.”[14] Essa virtude foi classificada por São Paulo como a maior das virtudes teologais. (cf. 1Cor 13, 13) Ora, o próprio Cristo resume seu mandamento nesta virtude: Dou-vos um mandamento novo: que vos ameis uns aos outros (cf. Jo 13, 34). 
Segundo o CIC “o exercício de todas as virtudes é animado e inspirado pela caridade, que é o vínculo da perfeição.”[15] Com a caridade aperfeiçoarmos nossa prática de amar, pois como nos lembra o capitulo treze da Primeira Carta aos Coríntios: ainda que  distribuísse meus bens aos pobres, sem amor nada disso adiantaria (cf. 1Cor 13). Segundo São Basílio: “A finalidade de todas as nossas obras é o amor. Este é o fim; é para alcançá-lo que corremos, é para ele que corremos; uma vez chagados, é nele que repousamos.”[16]
Estas virtudes estão revestidas pela força do Espírito Santo. Nelas os dons do Espírito se derramam como bênção de Deus sobre os homens. Esses dons agem como disposições, que impulsionam os homens a permanecerem dóceis aos apelos do Espírito. Segundo o CIC, os tese dons “completam e levam à perfeição as virtudes daqueles que o recebem.”[17]   Os tese dons são: sabedoria, inteligência, conselho, fortaleza, ciência, piedade e temor de Deus, que em plenitude pertencem a Cristo.
Concluindo, como tentamos demonstrar há dois tipos de virtudes: uma humana que chamamos de cardeais, outras que denominamos de virtudes teologais. As primeiras brotam da educação, isto é, da prática humana. As virtudes morais são fruto dos nossos exercícios e hábitos. As quatro virtudes cardeais (prudência, justiça, fortaleza e temperança) são base para as demais virtudes. As virtudes cardeais alimentam-se das virtudes teologais, porque é Deus quem ordena tudo. As virtudes teologais têm Deus por origem, motivo e objeto, Deus conhecido pela fé, esperado e amado por causa de si mesmo. As virtudes teologais (fé, esperança e caridade) informam e vivificam todas as virtudes morais.     



[1] Gn. 1, 26
[2] cf Aristóteles, Ética Aniômaco livros I e II.
[3] CIC, 1804
[4] idem,  1806
[5] idem , 1807
[6] idem , 1808
[7] Jo 16, 33
[8] CIC, 1809
[9] cf Aristóteles, Ética Anicômaco, livros VI e VII
[10] CIC, 1813
[11] idem, 1814
[12] Tg 2, 26
[13] CIC, 1817
[14] idem, 1822
[15] idem, 1827
[16] São Basílio, IN CIC, 1829
[17] CIC, 1831




A teologia da Cruz Pelo Papa Bento XVI

A teologia da Cruz Pelo Papa Bento XVI

Queridos irmãos e irmãs
Na experiência pessoal de São Paulo há um dado incontestável: enquanto no início fora um perseguidor e recorrera à violência contra os cristãos, a partir do momento da sua conversão no caminho de Damasco passara do lado de Cristo crucificado, fazendo dele a sua razão de vida e o motivo da sua pregação. A sua existência foi inteiramente consumida pelas almas (cf. 2 Cor 12, 15), nada tranquila nem protegida contra ameaças e dificuldades. No encontro com Jesus, tornou-se-lhe claro o significado central da Cruz: compreendera que Jesus tinha morrido e ressuscitado por todos e por ele mesmo. Ambas as realidades eram importantes; a universalidade: Jesus morreu realmente por todos; e a subjectividade: Ele morreu também por mim. Portanto, na Cruz manifestou-se o amor gratuito e misericordioso de Deus. Paulo experimentou este amor em si mesmo (cf. Gl 2, 20) e, de pecador, tornou-se crente; de perseguidor, Apóstolo. Dia após dia, na sua nova vida, experimentava que a salvação era "graça", que tudo derivava da morte de Cristo, e não dos seus méritos, que de resto não existiam. Assim, o "Evangelho da graça" tornou-se para ele o único modo de compreender a Cruz, o critério não somente da sua nova existência, mas também a resposta aos seus interlocutores. Entre eles havia, em primeiro lugar, os judeus que depositavam a própria esperança nas obras e delas esperavam a salvação; depois, havia os gregos, que à cruz opunham a sua sabedoria humana; finalmente, havia aqueles grupos de hereges, que tinham formado uma sua ideia do cristianismo segundo o seu próprio modelo de vida.
Para São Paulo a Cruz tem um primado fundamental na história da humanidade; ela representa o ponto focal da sua teologia, porque dizer Cruz significa dizer salvação como graça concedida a cada criatura.
O tema da Cruz de Cristo torna-se um elemento essencial e primário da pregação do Apóstolo: o exemplo mais claro diz respeito à comunidade de Corinto. Diante de uma Igreja onde estavam presentes de modo preocupante desordens e escândalos, onde a comunhão era ameaçada por partidos e divisões internas que debelavam a unidade do Corpo de Cristo, Paulo apresenta-se não com sublimidade de palavras ou de sabedoria, mas com o anúncio de Cristo, de Cristo crucificado. A sua força não é a linguagem persuasiva mas, paradoxalmente, a debilidade e a trepidação de quem se confia ao "poder de Deus" (cf. 1 Cor 2, 1-4). Por tudo aquilo que representa e portanto também pela mensagem teológica que contém, a Cruz é escândalo e loucura. O Apóstolo afirma-o com uma força impressionante, que é bom ouvir das suas próprias expressões: "Porque a linguagem da Cruz é loucura para aqueles que se perdem, mas poder de Deus para os que se salvam, isto é, para nós... aprouve a Deus salvar os fiéis por meio da loucura da pregação. Enquanto os judeus pedem sinais e os gregos buscam a sabedoria, nós anunciamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os pagãos" (1 Cor 1, 18-23).
As primeiras comunidades cristãs, às quais São Paulo se dirige, sabem muito bem que Jesus já ressuscitou e está vivo; o Apóstolo quer recordar não apenas aos Coríntios ou aos Gálatas, mas a todos nós, que o Ressuscitado é sempre Aquele que foi crucificado. O "escândalo" e a "loucura" da Cruz encontram-se precisamente no facto de que onde parece existir somente falência, dor e derrota, exactamente ali está todo o poder do Amor ilimitado de Deus, porque a cruz é expressão de amor, e o amor é o verdadeiro poder que se revela precisamente nesta aparente debilidade. Para os judeus, a Cruz é skandalon, ou seja, armadilha ou pedra de tropeço: ela parece impedir a fé do israelita piedoso, que tem dificuldade de encontrar algo de semelhante nas Sagradas Escrituras. Aqui, com não pouca coragem, Paulo parece dizer que a aposta é extremamente elevada: para os judeus, a Cruz contradiz a própria essência de Deus, que se manifestou mediante sinais prodigiosos. Portanto, aceitar a Cruz de Cristo significa realizar uma profunda conversão no modo de se relacionar com Deus. Se para os judeus o motivo da rejeição da Cruz se encontra na Revelação, ou seja, a fidelidade ao Deus dos Pais, para os gregos, ou seja os pagãos, o critério de juízo para se opor à Cruz é a razão. Com efeito, para estes últimos a Cruz é morta, loucura, literalmente insipiência, isto é, um alimento sem sal; por conseguinte, mais que um erro, é um insulto ao bom senso.
Em várias ocasiões, o próprio Paulo fez a amarga experiência da rejeição do anúncio cristão julgado "insipiente", desprovido de relevância, nem sequer digno de ser considerado no plano da lógica racional. Para quem, como os gregos, via a perfeição no espírito, no pensamento puro, já era inaceitável que Deus pudesse tornar-se homem, imergindo-se em todos os limites do espaço e do tempo. Além disso, era decididamente inconcebível acreditar que um Deus pudesse acabar numa Cruz! E vemos como esta lógica grega é também a lógica comum do nosso tempo. O conceito de apátheia, indiferença, como ausência de paixões em Deus, como poderia compreender um Deus que se tornou homem e foi derrotado, e que depois chegaria mesmo a resgatar o seu corpo para viver como ressuscitado? "Ouvir-te-emos falar sobre isto mais uma vez" (Act 17, 32), disseram com desprezo os atenienses a Paulo, quando ouviram falar de ressurreição dos mortos. Julgavam uma perfeição o libertar-se do corpo, concebido como prisão; como não considerar uma aberração o resgate do próprio corpo? na cultura antiga não parecia existir espaço para a mensagem do Deus encarnado. Todo o acontecimento "Jesus de Nazaré" parecia ser caracterizado pela mais total insipiência e, sem dúvida, a Cruz era o seu ponto mais emblemático.
Mas por que fez São Paulo precisamente disto, da palavra da Cruz, o ponto fundamental da sua pregação? A resposta não é difícil: a Cruz revela "o poder de Deus" (cf. 1 Cor 1, 24), que é diferente do poder humano; com efeito, revela o seu amor: "O que é considerado como loucura de Deus é mais sábio que os homens, e o que é tido como debilidade de Deus é mais forte que os homens" (Ibid., v. 25). A séculos de distância de Paulo, nós vemos que na história venceu a Cruz e não a sabedoria que se opõe à Cruz. O Crucifixo é sabedoria, porque manifesta verdadeiramente quem é Deus, ou seja, poder de amor que chega até à Cruz para salvar o homem. Deus serve-se de modos e de instrumentos que para nós, à primeira vista, parecem debilidade. O Crucifixo releva, por um lado, a debilidade do homem e, por outro, o verdadeiro poder de Deus, ou seja, a gratuidade do amor: precisamente esta total gratuidade do amor é a verdadeira sabedoria. São Paulo fez esta experiência até na sua carne, e disto dá-nos testemunho em várias fases do seu percurso espiritual, que se tornaram pontos de referência específicos para cada discípulo de Jesus: "Ele disse-me: basta-te a minha graça, porque é na fraqueza que a minha força se revela plenamente" (2 Cor 12, 9); e ainda. "Deus escolheu o que é fraco, segundo o mundo, para confundir o que é forte" (1 Cor 1, 27). O Apóstolo identifica-se a tal ponto com Cristo que também ele, embora se encontre no meio de muitas provações, vive na fé do Filho de Deus que o amou e se entregou pelos pecados dele e de todos (cf. Gl 1, 4; 2, 20). Este dado autobiográfico do Apóstolo torna-se paradigmático para todos nós.
São Paulo ofereceu uma síntese admirável da teologia da Cruz na segunda Carta aos Coríntios (5, 14-21), onde tudo está contido em duas afirmações fundamentais: por um lado Cristo, que Deus tratou como pecado em nosso benefício (v. 21), morreu por todos (v. 14); por outro, Deus reconciliou-nos consigo, sem atribuir a nós as nossas culpas (cf. vv. 18-20). É deste "ministério da reconciliação" que toda a escravidão já foi resgatada (cf. 1 Cor 16, 20; 7, 23). Aqui aparece como tudo isto é relevante para a nossa vida. Também nós temos que entrar neste "ministério da reconciliação", que supõe sempre a renúncia à própria superioridade e à opção da loucura do amor. São Paulo renunciou á própria vida, entregando-se totalmente a si mesmo pelo ministério da reconciliação, da Cruz que é salvação para todos nós. E também nós devemos saber fazer isto. Podemos encontrar a nossa força precisamente na humildade do amor, e a nossa sabedoria na debilidade de renunciar para entrar assim na força de Deus. Todos nós devemos formar a nossa vida sobre esta verdadeira sabedoria: não viver para nós mesmos, mas viver na fé naquele Deus, de quem todos nós podemos dizer: "Amou-me e entregou-se por mim!".



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