sábado, 3 de agosto de 2019

Homilia do XVIII Domingo do Tempo Comum (Ano C)


Homilia do XVIII Domingo do Tempo Comum (Ano C)


Um homem vem a Jesus pedindo que diga ao irmão que reparta consigo a herança. Depois de responder que Ele não é juiz sobre a questão, Jesus adverte: “Tomai cuidado contra todo tipo de ganância, porque, mesmo que alguém tenha muitas coisas, a vida de um homem não consiste na abundância de bens” (Lc 12, 15). E conta a parábola do homem que acumulou riquezas e morreu logo em seguida (Cf. Lc. 12, 13-21). Jesus conclui: “Assim acontece com quem ajunta tesouros para si mesmo, mas não é rico diante de Deus”. A Palavra de Deus estimula-nos a refletir sobre como deve ser a nossa relação com os bens materiais. A riqueza, mesmo sendo em si um bem, não deve ser considerada um bem absoluto. Dependendo do uso que se faça dela, a riqueza pode constituir a perdição do homem. Precisamente deste risco, Jesus, nessa página do Evangelho, adverte os seus discípulos. É sabedoria e virtude não apegar o coração aos bens deste mundo, porque tudo é passageiro, tudo pode terminar bruscamente. O verdadeiro tesouro que devemos procurar incessantemente para nós cristãos está nas “coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus”. Recorda-nos isto, hoje, São Paulo, na Carta aos Colossenses, acrescentando que a nossa vida “já está escondida, com Cristo, em Deus” (3, 1 – 3).
O Senhor ensina-nos que é uma insensatez colocar o coração, feito para a eternidade, na ânsia de riqueza e de bem estar material, porque nem a felicidade nem a vida verdadeiramente humana se fundamentam neles: “A vida de um homem não consiste na abundância de bens.” O rico da parábola revela o seu ideal de vida no diálogo que trava consigo próprio. Está seguro de si por ter muitos bens e por basear neles a sua estabilidade e felicidade. Viver é para ele, como para tantas pessoas, desfrutar do máximo que puder: trabalhar pouco, comer, beber, ter uma vida cômoda, dispor de reservas para longos anos. Este é o seu ideal.
E como dar segurança a uma vida construída a partir desse sentido puramente material dos dias? Diz: Armazenarei…No entanto, tudo o que não se constrói sobre Deus está falsamente construído. A segurança que os bens materiais podem dar é frágil e além disso insuficiente, porque só Deus pode nos tornar plenamente felizes. A fonte da vida está só em Deus.
Podemos perguntar-nos hoje: onde está o nosso coração? Em que se ocupa? Com que se preocupa? Com que se alegra ou com que se entristece? Daí ter mais consciência de que o nosso destino definitivo é o Céu, e que, se não o alcançarmos, nada de nada terá valido a pena.
A nossa passagem pela terra é um tempo para merecer; foi o próprio Senhor que nos deu esse tempo. Recorda-nos a Bíblia que “não temos aqui moradia (cidade) permanente, mas vamos em busca da futura” (Hb 13, 14). O Senhor virá chamar-nos, pedir-nos contas dos bens que nos deixou em depósito para que os administrássemos criteriosamente: a inteligência, a saúde, os bens materiais, a capacidade de amizade, a possibilidade de tornar felizes os que temos à nossa volta… O Senhor virá uma só vez, talvez quando menos O esperamos, como o ladrão na noite (Mt 25, 43), como um relâmpago no Céu (Mt 24, 27), e é preciso que nos encontre bem preparados. Quem vive só para os bens materiais, Deus o chama de néscio, louco! Não podemos nos esquecer que os bens são simples meios para alcançarmos a meta que o Senhor nos marcou. Nunca devem ser o fim dos nossos dias aqui na terra.
“Deus, porém, disse-lhe: ‘Insensato! Ainda nesta noite, pedirão de volta a tua vida’” (Lc 12, 20). O tempo é escasso: esta mesma noite…, e talvez nós estejamos pensando em muitos anos, como se a nossa passagem pela terra houvesse de durar para sempre! Os nossos dias estão numerados e contados; estamos nas mãos de Deus. Dentro de algum tempo – que nunca será tão longo como quereríamos –, encontrar-nos-emos face a face com o Senhor. Na Bíblia, o homem insensato é aquele que não quer compreender, da experiência das coisas visíveis, que nada dura para sempre, mas tudo passa: tanto a juventude, como a força física, quer as comodidades, quer as funções de poder. Por conseguinte, fazer depender a própria vida de realidades tão passageiras é insensatez. Por sua vez, o homem que confia no Senhor, não tem medo das adversidades da vida, nem sequer da realidade iniludível da morte: é o homem que adquiriu “um coração sábio”, como os Santos.
Meditar sobre o nosso fim, o encontro definitivo com Deus, ajuda-nos a aproveitar todas as circunstâncias desta vida para merecer e reparar pelos pecados, recuperando o tempo perdido. “Quem vive como se tivesse de morrer cada dia – visto que é incerta nossa vida por natureza – não pecará, já que o bom temor extingue grande parte da desordem dos apetites; pelo contrário, quem julga que vai ter uma vida longa, facilmente se deixa dominar pelos prazeres” (Santo Atanásio).
A insensatez do homem rico consiste em que considerou a posse de bens materiais como o único fim da sua existência e a garantia da sua segurança. É legítima a aspiração do homem a possuir o necessário para a sua vida e o seu desenvolvimento, mas ter como bem absoluto a posse de bens materiais acaba por destruir o homem e a sociedade.
O cristão não pode desprezar ou depreciar a existência temporal, pois toda ela deve servir como preparação para a sua existência definitiva com Deus no Céu. Só quem se torna rico diante de Deus, quem acumula tesouros que Deus reconhece como tais é que tira proveito certo destes dias terrenos. Fora isso, o resto é viver de enganos: “O homem passa como uma sombra, apenas sopro as riquezas que amontoa, sem saber para quem” (Sl 39 (38), 7). Aproveitemos bem, muito bem, cada instante de nossa existência!
Ao iniciar o Mês Vocacional, hoje, nossas orações são, de modo especial, para os sacerdotes! Rezemos pelas Vocações Sacerdotais, pelos seminaristas, pelos vocacionados! O Senhor chama aqueles que Ele quis ( Mc 3, 13 ). Essa é a razão suprema do chamado sacerdotal: o querer libérrimo de Deus, totalmente independente das qualidades pessoais daquele que é chamado. A vocação sacerdotal é, por isso, dom totalmente gratuito. A presença do sacerdote no mundo é absolutamente necessária para que a redenção alcance a todos os homens. A ação mais sublime que um homem pode realizar na terra – consagrar o Corpo e o Sangue do Senhor, e perdoar os pecados – só pode ser realizada por um sacerdote. “O padre possui a chave dos tesouros celestes: é ele que abre a porta; é o ecônomo do bom Deus; o administrador dos seus bens.” ( São João Maria Vianney ).
Rezemos para todos os sacerdotes possam acolher as palavras do Papa Bento XVl, dirigidas aos Participantes no Congresso Teológico, em 12 de março de 2010: “Caríssimos sacerdotes, os homens e as mulheres do nosso tempo só nos pedem que sejamos sacerdotes até ao fundo, e nada mais. Os fiéis leigos encontrarão em muitas outras pessoas aquilo de que humanamente têm necessidade, mas só no sacerdote poderão encontrar aquela Palavra de Deus que deve estar sempre nos seus lábios ( Cf. Presbyterorum ordinis, 4 ); a Misericórdia do Pai, abundante e gratuitamente concedida no Sacramento da Reconciliação; o Pão de Vida nova, “verdadeiro alimento oferecido aos homens”
A Virgem Maria, Mãe da Igreja, guarde o mais pequenino gérmen de vocação no coração daqueles que o Senhor chama a segui-Lo mais de perto; faça com que se torne uma árvore frondosa, carregada de frutos para o bem da Igreja e de toda a humanidade.

sábado, 20 de julho de 2019



Homilia do Pe. Fantico Borges, CM - Tempo Comum (Ano C)

Da desconfiança à hospitalidade

Nossa cultura é cada vez mais desconfiada. Tudo o que é estranho é uma ameaça para nós. Em alguns lugares das grandes cidades, esses condominios fechados, pode-se ver placas nas casas onde é anunciado que a polícia será chamada se vir estranhos andando pela rua. Nossas casas estão cada vez menos abertas, assim como nossas vizinhanças, nossas cidades e nossos países. A chegada de imigrantes em busca de trabalho gera desconfiança e insegurança entre os que já moram no país. Em geral, tudo o que é estranho e fora do comum nos faz sentir inseguros e ameaçados. É por isso que, e por nenhuma outra razão, que a violência aumenta. A violência é respondida com mais violência - embora em alguns casos seja defensiva - e a espiral de desconfiança e violência está crescendo.
A proposta das leituras de hoje é outra completamente diferente. Em consonância com a mensagem do Evangelho do Reino de Deus. Somos chamados à hospitalidade, ao acolhimento, a ação e a contemplação. A primeira leitura, do livro de Gênesis, mostra-nos Abraão, o patriarca, que não apenas acolhe os que lhe pedem hospitalidade, mas implora aos três homens que fiquem em casa e comam à sua mesa. Hospitalidade para essas pessoas era um dever sagrado e ao visitante devia-se todo o respeito do mundo. Era como se fosse o próprio Deus que visitava a casa. Muitas explicações foram dadas ao texto do Evangelho, mas geralmente o mais simples foi esquecido: Marta e Maria acolheram o Senhor em sua casa. Esse é o ponto de partida sem o qual aquela pequena contenda entre Marta e Maria nunca teria acontecido. Santo Agostinho comenta esta cena da seguinte maneira: "Marta envolveu-se em muitas coisas, preparando a comida do Senhor." Pelo contrário, Maria preferiu se alimentar daquilo que o Senhor dizia. Ela não percebeu de certa maneira a agitação contínua de sua irmã e sentou-se aos pés de Jesus, não fazendo nada, mas ouvindo suas palavras. Maria tinha entendido muito bem o que o Salmista dizia: "Descansa e vê que eu sou o Senhor" (Sl 46, 11). Marta era consumida enquanto Maria estava alimentando-se. Todavia, as duas realidades são importante na vida cristã. Uma necessita da outro, pois ação sem oração é mero assistecialismo e volutatismo, oração sem ação é uma alienação da realidade querida e desejada por Deus que veio para que todos tenham vida plena.
Durante séculos, Marta e Maria foram apresentadas como dois modelos contrastantes de vida: em Maria quis-se representar a contemplação, a vida de união com Deus; em Marta, a vida ativa do trabalho; mas a vida contemplativa não consiste em estar aos pés de Jesus sem fazer nada: isso seria uma desordem! As tarefas de cada um são precisamente o lugar onde nos encontramos com Deus, o eixo sobre o qual nosso chamado à santidade está baseado e gira. Sem um trabalho sério, consciente e prestigioso, seria muito difícil, se não impossível, ter uma vida interior profunda e exercer um apostolado eficaz no meio do mundo.
A maioria dos cristãos, chamados a se santificar no meio do mundo, não pode ser considerada como duas maneiras opostas de viver o cristianismo. Para uma vida ativa que esquece a união com Deus, é inútil e estéril; Uma suposta vida de oração que dispensa a preocupação apostólica e a santificação das realidades comuns não pode agradar a Deus. A chave é, portanto, saber unir essas duas vidas, sem prejuízo de uma ou outra. Essa profunda união entre ação e contemplação pode ser vivida de maneiras muito diferentes, de acordo com a vocação concreta que cada um recebe de Deus.
Hoje, mais do que nunca, precisamos de ação e oração como uma virtude que recupere a hospitalidade como um sinal cristão. Ser hospitaleiro com os vizinhos da frente, com as pessoas do trabalho, da escola, na rua. Mas também na frente dos vizinhos mais distantes, dos imaos imigrantes que batem nas portas do nosso país pedindo um emprego que lhes garanta pão e o futuro para eles e suas famílias. Também na frente daqueles que não acreditam em nossa mesma religião e na frente daqueles que não pertencem à nossa raça ou falam nossa língua. Somos todos irmãos e irmãs. Todos nós pertencemos à família de Deus. A encarnação de Jesus tornou cada homem e mulher o melhor e mais completo sacramento da presença de Deus entre nós. Para recebê-lo, compartilhar com ele o que temos para receber o mesmo Deus que vem nos visitar, para tornar o Reino uma realidade em nosso mundo, para cumprir a vontade de Deus que quer que todos nós nos sentemos na mesma mesa para compartilhar o mesmo pão da alegria e do amor. Somente a hospitalidade, as boas-vindas sinceras e abertas, a mão estendida, poderão unir um mundo dividido e divorcidado com Deus que parece que só é capaz de gerar desconfiança e violência.
Cada um deve pedir a Deus a força de Marta para trabalhar na construção do Reino de Deus e o desejo de Maria de estar sempre aos pés do Senhor alimentando-se de sua graça e  do seu amor.

Pe. Fantico Borges, CM



domingo, 16 de junho de 2019

HOMÍLIA DO PE. FANTICO BORGES, CM – SOLENIDADE DA SANTÍSSIMA TRINDADE


HOMÍLIA DO PE. FANTICO BORGES, CM –  SOLENIDADE DA SANTÍSSIMA TRINDADE

Trindade a comunidade de Amor

Após termos o mistério da vinda do Espírito Santo (Pentecostes), a liturgia propõe-nos outro mistério central de nossa fé: a Santíssima Trindade. Toda a vida da Igreja está impregnada desta realidade Trinitária. E quando falamos aqui de mistério, não pensemos no incompreensível, mais na realidade mais profunda que atinge o núcleo do nosso ser e do nosso agir da criação, da humanidade, da Igreja e de toda a realidade.
O mistério da Santíssima Trindade é manifesto desde o principio, mas se plenifica na pessoa do Filho que se encarna. É Cristo quem nos revela a intimidade do mistério trinitário e o convite para que participemos dele. “Ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt, 11, 27). Ele revelou-nos também a existência do Espírito Santo junto com o Pai e enviou-o à Igreja para que a santificasse até o fim dos tempos; e revelou-nos a perfeitíssima Unidade de vida entre as Pessoas divinas (Cf. Jo16, 12-15). Assim podemos dizer que há característica mais intima da realidade divina de Deus é a comunhão das pessoas divinas: Pai, Filho e Espirito Santo. Santo Tomas de Aquino falava da perfeitíssima pericorese entre as pessoas da Trindade, de modo que, são distintas, porém não indiferentes. Há uma unidade principiada no amor dos três. Essa comunidade, portanto, é a manifestação do amor em sua máxima relação.
O mistério da Santíssima Trindade é, por isso, o ponto de partida de toda a verdade revelada e a fonte de que procede a vida sobrenatural e para a qual nos encaminhamos: somos filhos do Pai, irmãos e co-herdeiros do Filho, santificados continuamente pelo Espírito Santo para nos assemelharmos cada vez mais a Cristo.
Por ser o mistério central da vida da Igreja, a Santíssima Trindade é continuamente invocada em toda a liturgia. Fomos batizados em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, e em seu nome perdoam-se os pecados; ao começarmos e ao terminarmos muitas orações, dirigimo-nos ao Pai, por mediação de Jesus Cristo, na unidade do Espírito Santo. Muitas vezes ao longo do dia, nós, os cristãos repetimos: Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo.
Desde que o homem é chamado a participar da própria vida divina pela graça recebida no Batismo, está destinado a participar cada vez mais dessa Vida trinitária. É um caminho que é preciso percorrer continuamente.
A Santíssima Trindade habita na nossa alma como num templo. E São Paulo faz-nos saber que o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado (Cf. Rm 5, 5). E aí, na intimidade da alma, temos de nos acostumar a relacionar-nos com Deus Pai, com Deus Filho e com Deus Espírito Santo. Dizia Santa Catarina de Sena: “Vós, Trindade eterna, sois mais profundo, no qual quanto mais penetro, mais descubro, e quanto mais descubro, mais vos procuro”.
Imensa é a alegria por termos a presença da Santíssima Trindade na nossa alma! Esta alegria é destinada a todo cristão, chamado à santidade no meio dos seus afazeres profissionais e que deseja amar a Deus com todo o seu ser; se bem que, como diz Santa Teresa, “há muitas almas que permanecem rodando o castelo (da alma), no lugar onde montam guarda as sentinelas , e nada se lhes dá de penetrar nele. Não sabem o que existe em tão preciosa mansão, nem quem mora dentro dela”. Nessa “preciosa mansão”, na alma que resplandece pela graça, está Deus conosco: o Pai, o Filho e o Espírito Santo.
Para o cristianismo a exigência da compreensão do mistério da Santíssima Trindade não tem um objetivo especulativo, mas sim espiritual e existencial, pois toda realidade subsiste nEla. A contemplação e o louvor à Santíssima Trindade são a substância da nossa vida sobrenatural, e esse é também o nosso fim: porque no Céu, junto de Nossa Senhora – Filha de Deus Pai, Mãe de Deus Filho, Esposa de Deus Espírito Santo: mais do que Ela, só Deus – , a nossa felicidade e o nosso júbilo serão um louvor eterno ao Pai, pelo Filho, no Espírito Santo. Esse louvor, todavia, não pode alienar-nos do compromisso com a fé aqui e agora já que construirmos neste mundo o caminho para o céu. Nossa fé na Trindade Santíssima nos impele a viver motivados por seu exemplo de comunhão e unidade e construirmos uma sociedade da paz, do amor, da justiça e do perdão.

Pe. Fantico Borges, CM




domingo, 9 de junho de 2019

Homilia Pe. Fantico Borges, CM – Solenidade de Pentecostes ano C



Homilia Pe. Fantico Borges, CM – Solenidade de Pentecostes ano C

Vem Espírito Santo: Senhor e doador de vida!

Celebramos hoje a grande festa de Pentecostes com a qual se completa o Tempo de Páscoa. Nesta liturgia recordamos o nascimento da Igreja pela efusão do Espírito Santo. Esta Solenidade faz-nos reviver a  vinda do Espírito Santo sobre os Apóstolos e os outros discípulos, reunidos em oração com a Virgem Maria no Cenáculo ( At 2, 1-11). Cantamos juntos num coro em festa: Veni, Sancte Spiritus! – Vinde, Espírito Santo! “Sem a vossa força e favor clemente, nada há no homem que seja inocente”: são palavras da sequência de Pentecostes, composta por John Dunstable (1380-1453) e que foi provavelmente entoada na coroação do rei inglês Henry VI, em Paris, em 1431. Toda a Igreja clama: Vem, Espírito Santo! “Ó Deus (…) derramai por toda a extensão do mundo os dons do Espírito Santo, e realizai agora no coração dos fiéis as maravilhas que operastes no início da pregação do Evangelho” (oração coleta da Missa do dia de Pentecostes).
O Espírito Santo age desde do princípio, primeiro como Espírito Criador e por último como Espírito Salvador. O Espírito Santo foi chamado alguma vez de “O Grande Desconhecido”. Isso faz lembrar aquela passagem dos Atos dos Apóstolos na qual Paulo ao chegar a Éfeso, ao conversar com alguns discípulos lhes pergunta: “Recebestes o Espírito Santo, quando abraçastes a fé?” Respondem eles: “Mas nem sequer ouvimos dizer que existe um Espírito Santo” (At 19,2). A impressão, muitas vezes, que temos é que alguns cristãos nem sabem se existe um Espírito Santo. Quem é o Espírito Santo? Qual sua importância na vinda do reino e na vida da Igreja? Ele é a terceira Pessoa da Santíssima Trindade, é “o Senhor e Doador de Vida, que procede do Pai e do Filho, que com o Pai e o Filho recebe uma mesma adoração e glória e que falou pelos profetas”. O Espírito Santo é Deus, como o Pai é Deus e como o Filho é Deus. Ele é o Paráclito, o Consolador, enviado por Cristo para comunicar-nos a vida divina. É Ele quem nos introduz no Mistério de Cristo, é Ele quem nos dá a graça, as virtudes da fé e da esperança e da caridade, os dons e os frutos. Quem é o Espírito Santo? É aquele que mora em você, o doce hóspede da sua alma, foi Ele quem o fez templo de Deus, filho de Deus, membro da Igreja, quem lhe deu a salvação, a justificação e a vida eterna. “Desde o nascimento da Igreja, é Ele quem dá a todos os povos, o conhecimento do verdadeiro Deus; e une, numa só fé, a diversidade das raças e línguas” (prefácio de Pentecostes).
Podemos dizer que não há Igreja sem Espírito Santo, que o Pentecostes é a autenticação da Igreja como sinal visível da graça de Deus neste mundo. Santa Teresa conta que, ao considerar certa vez a presença das Três divinas Pessoas na sua alma, “estava espantada de ver tanta majestade em coisa tão baixa como é a minha alma”, e então o Senhor disse-lhe: “Não é baixa, minha filha, pois está feita à minha imagem” (Santa Teresa, Contas de consciência, 41, 2). Nós fomos feitos à imagem e semelhança de Deus. Quis Deus que essa semelhança fosse semelhança mesmo e nos fez participar de sua natureza divina. É pelo Espírito Santo que nós participamos da natureza divina. “Como não dar graças a Deus pelos prodígios que o Espírito não cessou de realizar nestes dois milênios de vida cristã? O evento de graça do Pentecostes tem, com efeito, continuado a produzir os seus maravilhosos frutos, suscitando em toda a parte ardor apostólico, desejo de contemplação, empenho em amar e servir com total dedicação a Deus e aos irmãos. Ainda hoje o Espírito alimenta na Igreja gestos pequenos e grandes de perdão e de profecia, dá vida a carismas e dons sempre novos, que atestam a Sua ação incessante no coração dos homens” (João Paulo II, Homilia do Domingo de Pentecostes de 1998).
Pentecostes era uma festa celebrada pelos judeus após cinquenta dias depois da Páscoa. No começo era uma festa na qual se dava graças a Deus pela colheita da cevada e do trigo, era uma festa agrícola. Já no século I, porém, tornou-se a festa que celebrava a aliança (o dom da lei e a constituição do Povo de Deus). Cinquenta dias depois da Páscoa, os discípulos de Cristo recebem o Espírito Santo, a lei na nova aliança no sangue de Jesus. Também o Espírito Santo constitui a nova comunidade do Povo de Deus, a Igreja.
Nela, todos devem estar unidos em Cristo e na força do Espírito Santo. As línguas de Pentecostes significam essa unidade do Povo de Deus. Pentecostes é, então, o reverso de Babel (cf. Gn 11,1-9); em Babel, a dispersão, aqui, a unidade. O Espírito Santo, que é o amor do Pai e do Filho, é também amor entre nós. Lembremo-nos que é sempre o amor que une os corações. O amor, só pode ser conhecido propriamente pelos que se amam, por isso num mundo de ódio não há espaço para o Espírito Santo; num mundo sem perdão não há lugar para Deus; numa família sem amor, caridade, fraternidade não há lugar para o Pentecostes.
Temos que pedir e buscar o Espírito Santo como dom e graça diária. O Paráclito santifica a Igreja e a família continuamente, como também santifica cada alma, através das inúmeras inspirações que se escondem em “todos os atrativos, movimentos, censuras e remorsos interiores, luzes e conhecimentos que Deus produz em nós, prevenindo o nosso coração com as suas bênçãos, pelo seu cuidado e amor paternal, a fim de nos despertar, mover, estimular para o amor celestial, para as boas resoluções, para tudo aquilo que, numa palavra, nos conduz à vida eterna. A sua ação na alma é suave e aprazível; Ele vem salvar, curar, iluminar,” (São Francisco de Sales).
Hoje terminamos a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos; findamos a semana, não a oração pela unidade dos cristãos. Todos nós, discípulos-missionários de Cristo, precisamos – é importante para nós e para a evangelização – viver bem unidos: uma só fé, os mesmos sacramentos, um só governo: o do Papa e o dos Bispos em comunhão com ele. A divisão é vergonhosa para nós. “Celebrai, pois, este dia como membros do único corpo de Cristo. E não o celebrareis em vão, se realmente sois aquilo que celebrais, isto é, se estais perfeitamente incorporados naquela Igreja que o Senhor enche do Espírito Santo e faz crescer progressivamente através do mundo inteiro. (…) Esta é a casa de Deus, edificada com pedras vivas. Nela o Eterno Pai gosta de morar; nela seus olhos jamais devem ser ofendidos pelo triste espetáculo da divisão entre seus filhos” (Dos Sermões de um Autor africano anônimo do séc.VI).
Peçamos a Deus que se renove em nós hoje o Pentecostes com línguas de Fogo e com a força da unidade do Espírito que une o que estava dispersos e congrega os corações transviados. As línguas de fogo no dia de Pentecostes simbolizam a unidade da Igreja, ela falaria todas as línguas com a sua expansão; no entanto, essa que falaria todas as línguas encontra-se toda ali, unida. Essas línguas são de fogo. “O fogo simboliza a energia transformadora do Espírito Santo” (Cat. 696). Também ao Espírito Santo poderia aplicar-se o simbolismo da água, que significa “o nascimento e a fecundidade da vida dada no Espírito Santo” (Id.). Nós experimentamos a água e o fogo, ao mesmo tempo. Nascemos da água e do Espírito no nosso Batismo (cf. Jo 3,5), a partir daí o Espírito Santo começa uma ação muito especial em nós que vai transformando-nos mais e mais. São Basílio fala-nos da importância de estar com o Espírito Santo, ou melhor, de que o Espírito Santo esteja em nós: “Por estarmos em comunhão com Ele, o Espírito Santo torna-nos espirituais, recoloca-nos no Paraíso, reconduz-nos ao Reino dos céus e à adoção filial, dá-nos a confiança de chamarmos Deus de Pai e de participarmos na graça de Cristo, de sermos chamados filhos da luz e de termos parte na vida eterna” (Liber de Sp. Sancto, 15,36, em Cat. 736).

Pe. Fantico Borges, CM

sábado, 19 de janeiro de 2019

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – II Domingo do Tempo Comum – Ano C


Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – II Domingo do Tempo Comum – Ano C

O tempo da Alegria chegou: Jesus esta no meio de nós!

No tempo comum, que sucede as festas natalinas, revivemos os principais Mistérios da Salvação. Conhecemos a vida pública de Jesus suas ações ao longo de sua catequese ao Reino do Pai. O centro da liturgia desse domingo é o mistério nupcial de Deus com a humanidade. Esse mistério é apresentado numa boda de casamento. Lá Jesus manifestará seu poder de trazer a alegria perdida pelo pecado ao coração da humanidade. O vinho novo é essa alegria e essa alegria é Jesus Cristo, o verdadeiro noivo da humanidade.
O Evangelho (Jo 2, 1-11) fala das Bodas de Caná. O motivo da escolha deste texto, para este domingo – o segundo depois da Epifania – é explicado na frase conclusiva: Jesus, em Caná da Galiléia, deu inicio aos sinais e manifestou sua glória e seus discípulos creram nele (Cf. Jo 2, 11). A realidade manifestada por Jesus hoje é aquela dos designíos de Deus ao criar o homem e a mulher, ou seja, fazê-los para serem felizes. A felicidade ou a visão beatífica cujos santos são testemunhas reais é o caminho da realização humana e porta do céu. Por isso, uma pessoa de fé em Deus nunca deve cantar: felicidade foi embora... Nossa felicidade chegou exatamente com Jesus. Ele é a nossa felicidade. O cristão deve cantar assim: Cristo é a felicidade, sem ter Jesus nesta vida não há quem seja feliz de verdade!
Em Caná aconteceu uma nova epifania de Jesus: ele se manifestou como havia se manifestado no início aos magos e a João Batista no Batismo do Jordão. Segundo o costume da época a festa, o banquete, durava oito dias. Depois de alguns dias começou a faltar o vinho; a alegria daqueles esposos e de sua família estava ameaçada… Assim como muitas pessoas que vivem hoje sem esperança, não encontrando sentido para viver, sem motivação para sonhar. Deus sabe que a humanidade não consegue viver feliz sem encontrar o sentido da vida, e como o sentido nunca está em si mesmo, o homem necessita buscá-lo fora de si.
Todavia, como dizia São Agostinho: aquele que nos criou sem nós não quer nos salvar sozinho. Deus busca fazer o ser humano cooperar com a economia da Salvação. Assim Deus servirá da Virgem Santa Maria para manifestar seu amado Filho ao mundo triste e desiludido. Maria percebe a situação, e diz a Jesus, em tom aflito: “Eles não têm mais vinho”. Jesus pôs um pouco de resistência, mas depois fez o milagre: Da água soube tirar um novo vinho para continuar a festa. A presença de Jesus salvou a alegria dos esposos e permitiu que a festa continuasse.
Acontece em todo casamento aquilo que aconteceu nas Bodas de Caná; começa no entusiasmo e na alegria; o vinho é o símbolo, precisamente, desta alegria e do amor recíproco que lhe é a causa. Mas este amor e esta alegria – como o vinho de Caná – com o passar dos dias e dos anos, consome-se e começa a faltar; todo sentimento humano, exatamente porque humano, é recessivo, tende a consumir-se e a se exaurir; então desaba sobre a família uma nuvem de tristeza e desgosto; aos convidados para as bodas que são os filhos, não se tem mais nada a oferecer, a não ser o próprio cansaço, a própria frieza recíproca e muitas vezes a própria amarga desilusão. O fogo para o qual tinham vindo para se aquecer vai se apagando e todos procuram outros fogos fora dos muros da casa para aquecer o coração com um pouco de afeto.
Quantos casamentos vivendo, ou melhor, sobrevivendo por puro esteticismo sem fogo nenhum, sem alegria e repleto de ressentimentos e situações mal resolvidas. Em muitas situações hoje como faz falta ter uma Maria na vida da gente que sente e percebe a dor que estamos atravessando! Como faz falta aquele convidado ilustre que pode trazer a alegria novamente ao nosso coração! Há remédio para esta triste perspectiva ? Sim, o mesmo remédio que houve em Caná da Galiléia: Convidar Jesus para as bodas! Se ele for de casa, a ele se poderá recorrer quando enfraquecerem o entusiasmo, a atração física, a novidade, enfim, o amor com que se tinha começado como namorados, porque da água da “rotina”, ele saberá fazer brotar, pouco a pouco, um novo vinho melhor do que o primeiro, isto é, um novo tipo de amor conjugal, menos efervescente do que o da juventude, mas mais profundo, mais duradouro, feito de compreensão, de conhecimento mútuo, de solidariedade, feito também de muita capacidade de se perdoar.
Convidar Jesus para o próprio matrimônio! Sim, isto significa reconhecer desde o tempo de namoro que o matrimônio não é uma questão privada entre um homem e uma mulher, em que a religião e o padre devem entrar somente para pingar sobre nós um pouco de agra benta ou para lhe dar um pouco de prestígio exterior com órgão, flores e tapete, mas é uma vocação, um chamado para realizar, de certa forma, a própria vida e o próprio destino; vocação que vem de Deus cuja norma e cuja força devem orientar a vida do casal.
Merecem ser destacadas as palavras de Maria: “Eles não tem mais vinho”; “Fazei o que ele vos disser” (Jo 2, 3.5). “Em Caná, ninguém pede à Santíssima Virgem que interceda junto de seu Filho pelos consternados esposos. Mas o coração de Maria, que não pode deixar de ser compadecer dos infelizes, impele-a a assumir, por iniciativa própria, o ofício de intercessora e a pedir ao Filho o milagre. Se a Senhora procedeu assim sem que lhe tivessem dito nada, que Teria feito se lhe tivessem pedido que interviesse?” (Sto. Afonso Maria de Ligório). Que não fará quando – tantas vezes ao longo do dia! – lhe dizem “rogai por nós”? Que não iremos conseguir se recorremos a Ela? O que Nossa Senhora não fará pela família que reza em sua intercessão? O que a Virgem não pedirá a Deus pelas mães que rezam pelos seus filhos, pelos homens que do terço que imploram a intercessão da Mãe de Deus? Digo-lhes: ela fará todo o impossível para ajudar.
“Maria põe-se de permeio entre o seu Filho e os homens na realidade das suas privações, das suas infigências e dos seus sofrimentos. Maria faz-se de Medianeira, não como uma estranha, mas na posição de Mãe, consciente de que como tal pode – ou antes, tem o direito de – tornar presentes ao Filho as necessidades dos homens” (Beato João Paulo II).
Neste domingo o recado é nunca esquecer que se não cuidarmos o vinho pode faltar, mas se faltar é só pedir a Maria que fale com seu filho Jesus para trazer de volta a o vinho da alegria que está em seu Sagrado Coração.

Pe. Fantico Borges, CM


sábado, 12 de janeiro de 2019


Homilia do Pe. Fantico, CM – Solenidade do Batismo do Senhor.
Este é meu Filho amado!
Na liturgia deste domingo celebramos  o Batismo do Senhor onde somos chamados a meditar sobre nosso próprio batismo. Mergulhar na pia bastimal e redescobrir a chama acessa pela graça do novo nascimento espiritual. Essa Festa do Batismo do Senhor, celebrada no Domingo depois da Epifania encerra o ciclo das Festas da Manifestação do Senhor, o ciclo de Natal. Comemoramos o Batismo de Jesus por São João Batista nas águas do rio Jordão. Sem ter mancha alguma que purificar, Jesus quis submeter-se a esse rito tal como se submetera às demais observâncias legais que também não o obrigavam. Jesus deixou seu exemplo como prova de sua vontade.
O Senhor desejou ser batizado, diz Santo Agostinho, “para proclamar com a sua humildade o que para nós era uma necessidade”. Com o batismo de Jesus, ficou preparado o Batismo cristão, diretamente instituído por Jesus Cristo e imposto por Ele como lei universal no dia da sua Ascensão: Todo poder me foi dado no céu e na terra, dirá o Senhor; ide, pois, ensinai a todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo (Mt 28, 18-19).
O dia em que fomos batizados foi o mais importante da nossa vida, pois nele recebemos a fé e a graça. Antes de recebermos o batismo, todos nós nos encontrávamos com a porta do Céu fechada e sem nenhuma possibilidade de dar o menor fruto sobrenatural. É no batismo que o Céu se abre para cada um de nós e entramos em posse, novamente, da vida em Deus.
Para a tradição da Igreja o batismo de Jesus é a efusão do Espírito Santo sobre toda carne humana. Quando o Criador decidiu restaurar todas as coisas em Cristo e devolver à criação seu estado original, como também promover um tempo de graça e paz, escolheu também infundir nesta criação seu Espírito de Amor. Para São Cirilo de Alixandria “o tempo em que o Espírito Santo haveria de descer até nós, a saber, o tempo do advento de Cristo, e o prometeu dizendo: Naqueles dias – se refere aos dias do Salvador – derramarei meu Espírito sobre toda carne.” Este tempo manifestou-se no Batismo de Jesus, pois é através do Espírito derramado na carne de Cristo que nós podemos recebê-lo. Assim o Batismo do Senhor serve mais para nós do que para ele. Foi por nossa causa que ele foi batizado.
Dizer que Cristo recebeu o Espírito enquanto se fizera homem não se deseja diminuir o poder de Jesus nem fazê-lo uma criatura melhor. Ele é Filho de Deus Pai, gerado de sua substância, Deus de Deus, luz da luz. Cristo não se sente ofendido em escutar a voz que vem do céu e diz: esse é meu Filho amado... Nesta voz está um testemunho para todos, o de João. Ele sabe que aquele é o Enviado. Sabe porque é o Espírito de Deus quem autoriza a missão.
Ser batizado é ser um enviado pelo Espírito de Cristo para ir e dar frutos. Somente somos enviados à pela força do Espírito Santo. Cada batizado é um missionário de Cristo no Espírito. Todavia, essa missão não é simples e necessita de muita dedicação e tempo de preparação. Não basta dizer que é missionário precisa-se viver como missionário de Cristo. Ser um batizado em Cristo é ser um discípulo dele e agir como ele.
Essa missão é dada ao Filho de Deus chamado a ser servo sofredor. Jesus que é o Filho e será também o Servo sofredor, anunciado por Isaías. Hoje, o Pai revela a Jesus qual o modo, qual o caminho que ele deve seguir para ser o Messias como Deus quer: na pobreza, na humildade, no despojamento, no serviço! É assim que o Reino de Deus será anunciado no mundo.  Jesus deverá ser manso: “Ele não clama nem levanta a voz, nem se faz ouvir pelas ruas”. Deve ser cheio de misericórdia para com os pecadores, os fracos, os pobres, os sem esperança: “Não quebra a cana rachada nem apaga um pavio que ainda fumega”. Ele irá sofrer, ser tentado ao desânimo, mas colocará no seu Deus e Pai toda a sua esperança, toda a sua confiança: “Não esmorecerá nem se deixará abater, enquanto não estabelecer a justiça na terra”.  O Senhor Deus estará sempre com ele e ele veio não somente para Israel, mas para todas as nações da terra: “Eu, o Senhor, te chamei para a justiça e te tomei pela mão; eu te formei e te constituí como aliança do povo, luz das nações, para abrires os olhos aos cegos, tirar os cativos da prisão, livrar do cárcere os que vivem nas trevas”.
Jesus já começa cumprindo sua missão na humildade: ele entra na fila dos pecadores, para ser batizado por João. Ele, que não tinha pecado, assume os nossos pecados, faz-se solidário conosco; ele, o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo! “João tentava dissuadi-lo, dizendo: ‘Eu é que tenho necessidade de ser batizado por ti e tu vens a mim?’ Jesus, porém, respondeu-lhe: ‘Deixa estar, pois assim nos convém cumprir toda a justiça’” (Mt 3,14s). Assim convinha, no plano do Pai, que Jesus se humilhasse, se fizesse Servo e assumisse os nossos pecados! Ele veio não na glória, mas na humildade, não na força, mas na fraqueza, não para impor, mas para propor, não para ser servido, mas para servir. Eis o caminho que o Pai indica a Jesus, eis o caminho que Jesus escolhe livremente em obediência ao Pai, eis o caminho dos cristãos, e não há outro! Não podemos ser verdadeiramente cristãos sem assumir essa missão do servo de Deus.
Ser um cristão não é seguir uma ideologia, um movimento solidário, um partido. Ser cristão é seguir uma pessoa que fez uma opção radical por amor a Deus. Quem deseja ser cristão pensando em holofotes trabalha em vão, nada alcançará porque esse não é o caminho de Jesus. Quem não se humilha para seguir o exemplo do Mestre faz o caminho inverso. A simplicidade de Jesus, sua humildade e sua obediência são caminhos seguros de salvação.  
Hoje é um dia para agradecer a Deus a Graça do Batismo. Agradecer que nos tenha purificado a alma da mancha do pecado original, bem como de qualquer outro pecado que tivéssemos naquele momento. Essa graça sacramental nos convida a conversão e a mudança de vida. diz São Leãao Magno que por essa graça Deus afugenta os maus hóspedes que deseja instalar-se em nossos corações.   Hoje a liturgia faz um convide a retornar a pia batismal para verificar quem você matou e lá deixou para nunca mais voltar. Lá na pia batismal ficou o ser mundano, pervertido, viciado, injusto, mentiroso, orgulhoso e desobediente não deixei que ele torne a viver por seus maus atos. O convide, por fim, é para serdes santos e irrepreensíveis no amor.

Pe. Fantico Borges, CM


  

sábado, 5 de janeiro de 2019

Homilia da Solenidade da Epifania do Senhor – 2019


Homilia da Solenidade da Epifania do Senhor – 2019

Adoraremos o menino-Deus deitado no feno!

Hoje se celebra a epifania do Senhor. O termo grego tem o significado de auto-comunicação, entrada poderosa no campo da notoriedade e referencia-se à chegada de um rei. Também o termo servia para manifestação de uma divindade ou de alguma intervenção prodigiosa divina. Já no campo da fé a epifania entra desde II século com o qual se comemorava a celebração da vinda do Senhor.
A epifania marca a fase final do ciclo natalino. Celebra a manifestação de Deus ao mundo, na figura dos reis magos que, representando o mundo inteiro, vão adorar o menino Jesus em Belém. A liturgia, neste sentido, retorna o tema da luz – luz que brilha não só para o povo oprimido de Israel – como manifesta a leitura de Isaias –, mas para todos os povos, segundo a visão do profetismo universalista que escreveu o final de Isaias. Jerusalém, restaurada depois do exilio da Babilônia, é vista como centro para o qual convergem as caravanas do mundo inteiro. Essa visão recebe um sentido pleno quando os magos vindos do oriente procuram o messias nascido de Davi – nos arredores de Jerusalém, em Belém, cidade de Davi. E nesta visão São Paulo complementa que a vinda de Jesus não é benção apenas para Israel, mas também para todos, para os pagãos, os povos distantes.
Belém representa a comunidade-testemunho, não apenas o lugar oficial de Davi, lugar do império de Herodes. Ela é centro do mundo, não para si mesma, mas para quem  procura o agir de Deus. Não em Roma, nem em Jerusalém de Herodes, mas em Belém do presépio é que a estrela parou. Com isso Deus quer mostrar que a manifestação do reino não depende do poder humano, mas da força da graça de Deus. Diz São Leão Magno que quando os reis magos vieram adorar a Jesus, “eles não o viram expulsando a demônios, ressuscitando aos mortos, dando visão aos cegos, curando os aleijados, dando a faculdade de falar aos mudos, ou qualquer outro ato que revelava seu poder divino; mas viram a um menino que guardava silêncio, tranquilo, confiado aos cuidados de sua mãe” (São Leão Magno, Sermão sobre a Epifania).  
Ao significado dos três presentes que os reis levaram ao Menino Jesus: ouro, incenso e mirra, estão ali representados o significado da vida de Jesus no mundo.  Ao rei, o ouro; incenso a Deus deitado no presépio, mirra ao homem que morreria por nós.  Jesus é Deus, Homem e Rei. E, nessa sociedade que, entre outras coisas, coloca Deus em plano inferior Jesus quer reinar, deseja a adoração das suas criaturas, quer que os homens e as mulheres valorizem mais o ser humano como tal, que a pessoa humana não pise a própria dignidade. Por isso, quando vemos que homens envaidecidos pela sabedoria mundana, e apartados da fé de Jesus Cristo, são arrancados pelos pecados, da presença graça de Deus, e, por isso tratam mal seus semelhantes, só temos que pensar na necessidade de olhar para a estrela que guiou os magos e seguirmos o caminho do presépio, que nos levará à humilde cena do menino deitado no feno.  
Como os reis magos, tampouco nós iremos de mãos vazias ao encontro do Senhor; ao contrário, levaremos presentes ao Menino Jesus: a nossa adoração já que ele é Deus; as nossas reparações, que desejamos que estejam simbolizadas na mirra, àquele que morrerá pelos nossos pecados; levaremos ainda os propósitos de viver melhor como homens e como mulheres, como filhos e filhas de Deus, reconhecendo a alta dignidade que recebemos e à qual somos chamados. Alegramo-nos com “profunda alegria” (Mt 2,10) ao ver a estrela de Belém, isto é, ao ver esse Menino que iluminou a nossa vida e nos deu a missão de iluminar a dos outros, não com outra luz, mas com a sua. Efetivamente, com a vinda do Filho de Deus, todos, sem distinção, podem caminhar segundo Deus. Todos somos filhos de Deus, todos somos irmãos.
Nós, os cristãos, temos que manifestar aos outros o sentido das suas próprias vidas através da consciência e da vivência do autêntico sentido da existência. Todos precisam saber o porquê estão nesse mundo: para amar, adorar e glorificar a Deus, para receber os grandes presentes que o Senhor quis trazer-nos, para vivermos como irmãos. Nós fomos criados para a felicidade. Deus quer que sejamos felizes também aqui na terra e, depois, no céu… para sempre!
São Boaventura afirmava que a estrela que nos conduz a Jesus é triple: “a Sagrada Escritura, que temos que conhecê-la muito bem. A outra estrela é a aquela que sempre nos está facilitando andar pelas sendas de Deus fazendo-nos ver e acertar o caminho, esta estrela é a Mãe de Deus, Maria. A terceira estrela é interior, pessoal, e são as graças do Espírito Santo”.
E se quiséssemos considerar atentamente como possível, para todos os que se aproximam a Cristo pelo caminho da fé, aquela tríplice classe de dons, não descobriríamos que esta oferenda se realiza no coração de quantos retamente creem no Cristo? Retire efetivamente ouro do tesouro de seu coração quem reconhece a Cristo como rei no universo; oferece mirra quem crê que o unigênito de Deus assumiu uma verdadeira natureza humana; venera a Cristo com uma espécie de incenso quem confessa que ele em nada é diferente da majestade do Pai. Tudo isso munido de uma vida perpassada pelas ações de caridade, promoção da vida, orações contates, frequência à confissão e participação regular à eucaristia.

Pe. Fantico Borges, CM

Homilia do XVIII Domingo do Tempo Comum (Ano C)

Homilia do XVIII Domingo do Tempo Comum (Ano C) Um homem vem a Jesus pedindo que diga ao irmão que reparta consigo a herança. Depois ...