Homilia do XVIII Domingo do
Tempo Comum (Ano C)
Um homem vem a Jesus pedindo que diga ao
irmão que reparta consigo a herança. Depois de responder que Ele não é juiz
sobre a questão, Jesus adverte: “Tomai cuidado contra todo tipo de ganância,
porque, mesmo que alguém tenha muitas coisas, a vida de um homem não consiste
na abundância de bens” (Lc 12, 15). E conta a parábola do homem que acumulou
riquezas e morreu logo em seguida (Cf. Lc. 12, 13-21). Jesus conclui: “Assim
acontece com quem ajunta tesouros para si mesmo, mas não é rico diante de
Deus”. A Palavra de Deus estimula-nos a refletir sobre como deve ser a nossa
relação com os bens materiais. A riqueza, mesmo sendo em si um bem, não deve
ser considerada um bem absoluto. Dependendo do uso que se faça dela, a riqueza
pode constituir a perdição do homem. Precisamente deste risco, Jesus, nessa
página do Evangelho, adverte os seus discípulos. É sabedoria e virtude não
apegar o coração aos bens deste mundo, porque tudo é passageiro, tudo pode
terminar bruscamente. O verdadeiro tesouro que devemos procurar incessantemente
para nós cristãos está nas “coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita
de Deus”. Recorda-nos isto, hoje, São Paulo, na Carta aos Colossenses,
acrescentando que a nossa vida “já está escondida, com Cristo, em Deus” (3, 1 –
3).
O Senhor ensina-nos que é uma insensatez
colocar o coração, feito para a eternidade, na ânsia de riqueza e de bem estar
material, porque nem a felicidade nem a vida verdadeiramente humana se
fundamentam neles: “A vida de um homem não consiste na abundância de bens.” O
rico da parábola revela o seu ideal de vida no diálogo que trava consigo
próprio. Está seguro de si por ter muitos bens e por basear neles a sua
estabilidade e felicidade. Viver é para ele, como para tantas pessoas,
desfrutar do máximo que puder: trabalhar pouco, comer, beber, ter uma vida
cômoda, dispor de reservas para longos anos. Este é o seu ideal.
E como dar segurança a uma vida construída a
partir desse sentido puramente material dos dias? Diz: Armazenarei…No entanto,
tudo o que não se constrói sobre Deus está falsamente construído. A segurança
que os bens materiais podem dar é frágil e além disso insuficiente, porque só
Deus pode nos tornar plenamente felizes. A fonte da vida está só em Deus.
Podemos perguntar-nos hoje: onde está o nosso
coração? Em que se ocupa? Com que se preocupa? Com que se alegra ou com que se
entristece? Daí ter mais consciência de que o nosso destino definitivo é o Céu,
e que, se não o alcançarmos, nada de nada terá valido a pena.
A nossa passagem pela terra é um tempo para
merecer; foi o próprio Senhor que nos deu esse tempo. Recorda-nos a Bíblia que
“não temos aqui moradia (cidade) permanente, mas vamos em busca da futura” (Hb
13, 14). O Senhor virá chamar-nos, pedir-nos contas dos bens que nos deixou em
depósito para que os administrássemos criteriosamente: a inteligência, a saúde,
os bens materiais, a capacidade de amizade, a possibilidade de tornar felizes
os que temos à nossa volta… O Senhor virá uma só vez, talvez quando menos O
esperamos, como o ladrão na noite (Mt 25, 43), como um relâmpago no Céu (Mt 24,
27), e é preciso que nos encontre bem preparados. Quem vive só para os bens
materiais, Deus o chama de néscio, louco! Não podemos nos esquecer que os bens
são simples meios para alcançarmos a meta que o Senhor nos marcou. Nunca devem
ser o fim dos nossos dias aqui na terra.
“Deus, porém, disse-lhe: ‘Insensato! Ainda
nesta noite, pedirão de volta a tua vida’” (Lc 12, 20). O tempo é escasso: esta
mesma noite…, e talvez nós estejamos pensando em muitos anos, como se a nossa
passagem pela terra houvesse de durar para sempre! Os nossos dias estão
numerados e contados; estamos nas mãos de Deus. Dentro de algum tempo – que
nunca será tão longo como quereríamos –, encontrar-nos-emos face a face com o
Senhor. Na Bíblia, o homem insensato é aquele que não quer compreender, da
experiência das coisas visíveis, que nada dura para sempre, mas tudo passa:
tanto a juventude, como a força física, quer as comodidades, quer as funções de
poder. Por conseguinte, fazer depender a própria vida de realidades tão
passageiras é insensatez. Por sua vez, o homem que confia no Senhor, não tem
medo das adversidades da vida, nem sequer da realidade iniludível da morte: é o
homem que adquiriu “um coração sábio”, como os Santos.
Meditar sobre o nosso fim, o encontro
definitivo com Deus, ajuda-nos a aproveitar todas as circunstâncias desta vida
para merecer e reparar pelos pecados, recuperando o tempo perdido. “Quem vive
como se tivesse de morrer cada dia – visto que é incerta nossa vida por
natureza – não pecará, já que o bom temor extingue grande parte da desordem dos
apetites; pelo contrário, quem julga que vai ter uma vida longa, facilmente se
deixa dominar pelos prazeres” (Santo Atanásio).
A insensatez do homem rico consiste em que
considerou a posse de bens materiais como o único fim da sua existência e a
garantia da sua segurança. É legítima a aspiração do homem a possuir o
necessário para a sua vida e o seu desenvolvimento, mas ter como bem absoluto a
posse de bens materiais acaba por destruir o homem e a sociedade.
O cristão não pode desprezar ou depreciar a
existência temporal, pois toda ela deve servir como preparação para a sua
existência definitiva com Deus no Céu. Só quem se torna rico diante de Deus,
quem acumula tesouros que Deus reconhece como tais é que tira proveito certo
destes dias terrenos. Fora isso, o resto é viver de enganos: “O homem passa
como uma sombra, apenas sopro as riquezas que amontoa, sem saber para quem” (Sl
39 (38), 7). Aproveitemos bem, muito bem, cada instante de nossa existência!
Ao iniciar o Mês Vocacional, hoje, nossas
orações são, de modo especial, para os sacerdotes! Rezemos pelas Vocações
Sacerdotais, pelos seminaristas, pelos vocacionados! O Senhor chama aqueles que
Ele quis ( Mc 3, 13 ). Essa é a razão suprema do chamado sacerdotal: o querer
libérrimo de Deus, totalmente independente das qualidades pessoais daquele que
é chamado. A vocação sacerdotal é, por isso, dom totalmente gratuito. A
presença do sacerdote no mundo é absolutamente necessária para que a redenção
alcance a todos os homens. A ação mais sublime que um homem pode realizar na
terra – consagrar o Corpo e o Sangue do Senhor, e perdoar os pecados – só pode
ser realizada por um sacerdote. “O padre possui a chave dos tesouros celestes:
é ele que abre a porta; é o ecônomo do bom Deus; o administrador dos seus bens.”
( São João Maria Vianney ).
Rezemos para todos os sacerdotes possam
acolher as palavras do Papa Bento XVl, dirigidas aos Participantes no Congresso
Teológico, em 12 de março de 2010: “Caríssimos sacerdotes, os homens e as
mulheres do nosso tempo só nos pedem que sejamos sacerdotes até ao fundo, e
nada mais. Os fiéis leigos encontrarão em muitas outras pessoas aquilo de que
humanamente têm necessidade, mas só no sacerdote poderão encontrar aquela
Palavra de Deus que deve estar sempre nos seus lábios ( Cf. Presbyterorum
ordinis, 4 ); a Misericórdia do Pai, abundante e gratuitamente concedida no
Sacramento da Reconciliação; o Pão de Vida nova, “verdadeiro alimento oferecido
aos homens”
A Virgem Maria, Mãe da Igreja, guarde o mais
pequenino gérmen de vocação no coração daqueles que o Senhor chama a segui-Lo
mais de perto; faça com que se torne uma árvore frondosa, carregada de frutos
para o bem da Igreja e de toda a humanidade.