Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – III domingo do Advento ano b 2017
A Alegria do
Senhor é a nossa Força, por isso, alegrai-vos nEle!
A litúrgica da Igreja chama este
Terceiro Domingo do Advento de Gaudete, isto é “Alegria!” “Alegrai-vos
sempre no Senhor. De novo eu vos digo: alegrai-vos! O Senhor está perto!” (Fl
4,4.5).
No domingo anterior vimos a figura de
João Batista, como o Evangelho de Marcos nos apresentou: o profeta do reino,
que pregou um batismo de conversão. Neste domingo, no Evangelho, podemos ver
como o evangelista João identifica o Batista: como a voz que clama no deserto,
ou seja, a testemunha da glória de Deus no Filho. Em São Marcos, centrado na
figura de Jesus que proclama a chegada do Reino de Deus, o Batista é o profeta
escatológico, o novo Elias, que deve preparar aos corações para que, mediante a
conversão, participem do Reino. Já no evangelista São João, que evita a
historização do Reino, como também o tradicionalismo das conceituações
apocalípticas sobre o profeta do fim; a figura do Batista é tomada como um
sinal que aponta o envio de Deus, o qual estar desconhecido no meio do mundo.
Por isso, João Batista é chamado de voz que clama no deserto! Se, portanto, o
Batista aponta essa Luz como estando presente, desconhecida, no meio de nós,
ela não apenas quer dizer que (ainda) não tivemos a chance de descobri-la, mas
sugere que é preciso querer descobri-la. Para poder ver é preciso querer ver.
Assim, o Evangelho de hoje desperta em nós a necessidade de uma decisão pelas
palavras do Batista “No meio de vós está quem vós não conheceis”, somos
convidados a querer descobri-lo, dilatando nosso coração em Alegria.
A alegria do Senhor é ver-nos felizes! Assim
a liturgia de hoje revela a proximidade do Natal! Diz São Paulo aos
tessalonicenses: Alegrai-vos no Senhor e rezai sem cessar... Afastai-vos de
toda espécie de maldade, não apagueis o Espírito, isto é, guardai vivo o fogo
interior e incentivai com ações visíveis diante dos irmãos, para que o Deus da
paz vos santifique totalmente e tudo aquilo que sois: alma, corpo e espírito
sejam guardados sem mancha alguma para vinda de nosso Senhor Jesus Cristo. Deus
através do Apóstolo admoesta para, ponderando tudo, avaliar segundo a vontade de
Deus e ficar com aquilo que serve para nossa salvação.
Paulo nos aponta onde nasce a verdadeira
alegria: ela nasce da oração: rezai sem cessar; daí graças em todas as
circunstâncias; aqueles que rezam alcançam a graça de Deus e a felicidade
duradoura. Mas o que significa essa alegria no mundo hoje? Para muito é o
banquete da ceia natalina, um restaurante cinco estrelas, um hotel de luxo,
etc. Mas a alegria verdadeira é outra! São Paulo dizia “por tudo dai graças a Deus”.
A alegria nasce da abertura do coração aos apelos do Espírito que convida à
conversão, a mudança de vida; nasce de uma vida moral irrepreensível
(afastai-vos de toda espécie de maldade!), ou seja, dos pecados, dos vícios, das
injustiças, do adultério, da mentira, da calunia e por fim a alegria nasce de
uma vida santa: tudo que sois, seja preservado de toda mancha do pecado, isto
é, que os poderes infernais não dominem sobre os filhos da luz. Para tudo isso
é necessário acreditar que “Aquele que vos chamou é fiel.” Com essa certeza
corramos ao encontro do Cristo que vem, tendo nossas lâmpadas acessas pela consciência
da nossa condição de criaturas diante do Criador.
A vinda de Jesus, feito homem, abriu o
caminho que nossos pecados fecharam. A trilha tortuosa em que o homem vivia por
sua culpa foi endireitada pelo percussor para que o homem encontrasse novamente
a luz que é Jesus. Segundo São Cirilo de Alexandria “existem acessos públicos e
trilhas quase impraticáveis, íngremes e intransitáveis, que algumas vezes
obrigam a subir os montes e as colinas, e outras a descê-las; ora te colocam à
beira de precipícios, ora te fazem escalar altíssimas montanhas. Porém, se
estes lugares isolados e abruptos descerem, e se preencherem as cavidades profundas,
aí sim, o torcido se endireita totalmente, os campos se aplainam e os caminhos,
antes íngremes e tortuosos, tornam-se transitáveis. É isso, só que em nível
espiritual, o que faz acontecer o poder do salvador” (São Cirilo de Alexandria,
Comentários sobre o livro do profeta Isaias, 3,4). Podemos dizer que aos homens
estava vedado o acesso a uma vida exemplar, pois a alma aprisionada pelo
pecado, mergulhada nos apetites mundanos, entorpecida aos impulsos abomináveis
da carne, não enxergava a luz de Deus. Uma vez que Cristo se fez carne e
destruiu o pecado, abatendo o soberano mal dominador deste mundo, Ele nivelou o
caminho para nós, um caminho muito apto para correr nas sendas da piedade; um
caminho sem encostas acima, nem declives ladeirentos, realmente liso e plano.
Só Cristo é a luz que não tem ocaso, a salvação eterna. Ele é o caminho da
glória do Senhor, e todos, contemplamos sua glória, glórias que antes não
conhecíamos, e, só depois da encarnação passamos conhecê-la e ama-la como única
salvação.
No sentido acima exposto a alegria é uma
busca por colocar-se no seguimento de Jesus. João Batista, aquele que
testemunha a chegada de Deus nos oferece uma exemplo claro de como devemos comporta-nos
diante de Deus. Ele não é arrogante nem tenta enganar os outros querendo ser o
que não é. Dirá com isso Santo Agostinho: “João era a voz, mas o Senhor, no
princípio, era a Palavra. João era a voz passageira, Cristo a Palavra eterna
desde o princípio”. João sabia que não era a palavra e que sem ela ressoava ao
ouvida, mas não alimentava o coração. João é voz que clama no deserto: aplainai
os caminhos do Senhor. E porque é difícil não confundir a voz com a palavra, julgaram
que João era Cristo. Confundiram a voz com a palavra. Mas a voz reconheceu o
que era para não prejudicar a palavra. Eu não sou o Cristo (Jo 1,20), disse
João nem Elias, nem profeta. Sou apenas a voz que clama no deserto. E novamente
dirá Agostinho: “O que significa: Aplainai o caminho do Senhor, senão: Orai
como se deve ser? O que significa ainda: Aplainai o caminho senão: tende
pensamentos humildes? Imitai o exemplo de João. Julgam que é o Cristo e ele diz
não ser aquele que julgam; não se aproveita do erro alheio para uma afirmação
pessoal. Se tivesse dito: ‘eu sou o Cristo’, facilmente teriam acreditado nele,
pois já era considerado como tal antes que o dissesse. Mas não disse; pelo
contrario, reconheceu o que era, disse o que não era, foi humilde. Viu de onde
lhe vinha a salvação; compreendeu que era uma lâmpada e temeu que o vento do orgulho pudesse apaga-la” (Santo
Agostinho, dos Sermões 293, 3).
João reconhece aquele que nos traz a
alegria verdadeira. Nossa alegria está no Senhor e não em outro. Alegrai-vos!
Há quem se alegre no pecado, há quem se alegre em futilidades, há quem, mesmo
alegrando-se com coisas que valem a pena, esquece que toda alegria é
passageira. Quanto a vós, caríssimos, alegrai-vos com tudo quanto é bom e
louvável, mas colocai vossa maior e definitiva alegria no Senhor! Somente nele
o coração repousa plenamente, somente nele encontramos a paz que dura mesmo em
meio à tribulação mais feroz, somente nele o anseio mais profundo de nossa alma
encontra satisfação. Como lembrava-nos Agostinho nas Confissões: “Nosso coração
estará inquieto enquanto não repousar no Senhor”. Alegrai-vos! Mas seja o
Senhor o fundamento da vossa alegria, a causa última da vossa exultação!
Resta-nos, então, escutar com atenção este
ultimo conselho de São João Crisótomo: “Que pode perturbar o santo? A morte?
Não, porque a deseja como prêmio. As injúrias? Não, porque Cristo ensinou a
sofrê-las. A doença? Também não, porque a Escritura aconselha: Aceita tudo o
que Deus te mandar, e permanece em paz na tua dor, e no tempo da humilhação tem
paciência; porque o ouro e a prata se provam no fogo, e os homens amados de
Deus, no cadinho da tribulação (Ecl 2, 5). Que resta então, que seja capaz de
perturbar o santo? Nada. Na terra, até a alegria costuma acabar em tristeza;
mas, para quem vive de acordo com Cristo, as próprias penas se transformam em
alegrias” (Homilias sobre as estátuas, 18).
Num mundo que despreza ou ao menos é
indiferente a Deus e seus mandamentos, numa sociedade pagã, senão secularizada
que ridiculariza a fé e olha com indiferença os que amam a Deus, tenhamos esta
certeza: “Quem vos chamou é fiel; ele mesmo realizará isso!” Ele nunca nos
deixará! Ele é a nossa alegria, esta alegria é a nossa força!
Pe. Fantico Borges, CM
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