Homilia do Pe. Fantico Borges – XXXIII Domingo do
Tempo Comum – Ano A
Trabalhai
para sua santificação!
Caríssimos irmãos e irmãs se aproxima o domingo de Cristo Rei. A
liturgia vai tomando como pano de fundo o juízo do justo rei-juiz de todos. Como
doador dos dons Deus chamará todos para prestar contras dos talentos entregues
a cada um, segundo sua capacidade. Aquele que recebeu cinco talentos e o que
recebeu somente dois foram bons trabalhadores. Cada um deles, recebidos os
talentos, “negociou com eles; fê-los produzir, e ganhou outros” (Mt 25,16). É
preciso trabalhar! Mais ainda, é preciso trabalhar bem! São João Paulo II, na
sua Carta Encíclica sobre o trabalho humano Laborem
exercens, falava de “elementos para
uma espiritualidade do trabalho”. O trabalho é dom de Deus em nossas
vidas.
Também é verdade que muitas pessoas não querem trabalhar. São
preguiçosas e escondem os talentos para não se fadigarem. Quem não trabalho,
diz o Apóstolo Paulo, não deve comer! Com o nome de talento se deve entender
aquilo que qualquer pessoa recebeu. São Gregório Magno diz que devemos saber
que não existe ninguém ocioso que esteja seguro de não ter recebido algum
talento, porque não existe ninguém que diga: “eu não recebi nenhum talento,
portanto não estou obrigado a prestar contas” (São Gregório Magno: sermões sobre os Evangelhos, 9). Todos,
cristãos ou ateus, pobres ou ricos, negros ou brancos receberam bens para seu
crescimento pessoal e para colaboração no crescimento dos outros. Esses talentos são oportunidades da mente
humana crescer e produzir frutos para si e para o mundo. Quem se abstém desta
tarefa desvincula-se de sua missão existencial.
Podemos ter a certeza
que o Senhor nos deu uma vida, “a cada um de acordo com a sua
capacidade”. Ora, é esta vida, dom de Deus, fruto de um desígnio de amor
sem fim, que cada um de nós deve responsavelmente cultivar e fazer frutificar
em benefício para nosso irmãos e irmãs. Na leitura de provérbios a figura da mulher
forte aparece como um exemplo de alguém que não se contenta em passar pela
vida, mas vai tecendo o fio da existência com as pequenas fidelidades de cada
dia. O importante da vida é observar o essencial, a beleza que escode-se por
detrás das coisas que fazemos. A aparente estética das coisas passará, a
verdadeira vida encontra-se no temor do Senhor.
Do mesmo modo, a segunda leitura chama-nos atenção para o fato que nos
serão pedidas contas da vida, dom recebido de Deus. Daí, o conselho: “Não
durmamos, como os outros, mas sejamos vigilantes e sóbrios”. São Gregório diz
que devemos considerar o que temos recebido para empregá-lo bem. Que não exista
nenhum cuidado terreno que nos impeça a vida espiritual, para que não venha a
acontecer que, escondendo o talento na terra, provoque-se a ira do Senhor dos
talentos.
O mundo moderno, com todo
sua técnica, pensa que a existência material é seu modo absoluto de ser.
Fechados em si mesmos, os homens pensam que podem ser felizes construindo a
vida de seu próprio modo, dando os parâmetros do seu agir. Esta é a grande
tentação pós-moderna! Que grande Ilusão! A vida é dom de Deus e somente nos faz
felizes se dela fizermos um diálogo amoroso com o Senhor, autor e doador de
nosso ser. Mais que talentos na vida, o Senhor nos concedeu a própria vida como
um precioso talento. Desenvolvê-lo, ser feliz e buscar não a nossa própria
satisfação, não nossa própria medida, não nosso próprio caminho, mas fazer da
existência uma busca amorosa e cheia de generosidade da vontade de Deus, isso
sim realiza o ser humano porque mais que tenha coisas e poder a vida somente é
bela se é cheia de sentidos que transcendem os bens materiais. O mundo dos
ricos já demostra que ter nunca é sinal de felicidade. Muitas pessoas que
possuem bens, títulos, aplausos, também comentem suicídio. Ser feliz é
encontrar sentidos transcendentais, divinos para viver. Eis! Somente seremos
felizes e maduros quando tivermos a capacidade de arriscar verdadeiramente nos
perder, nos deixar para nos encontrar no Senhor, alicerce e fonte de nossa
vida. Eis o verdadeiro investimento!
Infelizmente, a
dinâmica do mundo hodierno, pagão e ateu, não nos ajuda nessa direção. Há
distração demais, novidade demais, produto demais a ser consumido; há
preocupação demais com uma felicidade compreendida como satisfação de nossos
desejos, carências e vontades. Há consciência de menos de que a vida é dom e
serviço, doação e abertura para o infinito; há percepção de menos de que aqui
estamos de passagem e de que lá, junto ao Senhor, é que permaneceremos para
sempre. Atolamo-nos de tal modo nos afazeres da vida, no corre-corre de nossas
atividades, no esforço por satisfazer nossas vontades, na busca de nossa
auto-afirmação, que perdemos a capacidade de compreender realmente que somos
passageiros e viajantes numa existência breve e fugaz que somente valerá a pena
se vivida na verdade, se for compreendida como abertura para o Senhor e se por
amor a ele, for abertura generosa e servidora para os outros.
A advertência do
Apóstolo Paulo deve nos conduzir nesta meditação: “Vós, meus irmãos,
não estais nas trevas, de modo que esse dia vos surpreenda como um ladrão.
Todos vós sois filhos da luz e filhos do dia”. Vivamos da Luz. O vaticano
II dizia Lumen gentium Christis - Cristo,
Luz dos povos. Viver na luz, viver no dia é viver na perspectiva de Cristo
Jesus, é valorizar o que ele valoriza e desprezar o que ele despreza. Filhos da
luz, filhos do dia – eis o que deveríamos ser! Mas, com tanta frequência nossa
mente e nosso coração, nossos pensamentos e nossos afetos encontram-se
entenebrecidos como o dos pagãos… Quão grave para nós, porque conhecemos a Luz,
cremos no Dia que é o Cristo-Deus! Será
que ignoramos quem é o dono dos talentos? Será que desprezamos seus bens a
ponto de tornamo-lo infrutíferos? Por acaso fazemos pouco caso do juízo divino?
Consideremos, pois, o que é que temos recebido, e estejamos atentos para
empregá-lo bem. O servo preguiçoso, quando o juiz pede contas das culpas,
desenterra o talento. Existe, portanto, muitos que se afastam dos desejos e
obras terrenas, por aviso do juiz, quando já entregues ao suplicio eterno.
Vigiemos, portanto, antes que nos seja solicitada a conta do talento, para que,
quando o juiz estiver ameaçando com castigo, sejamos libertos dele pelo lucro
que tivermos alcançado.
Peçamos ao bondoso Deus
que não sejamos tragados pelo desanimo da tardança dos frutos, nem pelas
tarefas puramente mudando sem dar a devida atenção às coisas do alto. Que Maria
santíssima passe à frente de nossos empreendimentos para pensarmos e agirmos em
vista do Reino de seu Filho Jesus Cristo.
Pe. Fantico Borges,
CM
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