sábado, 24 de março de 2018

Homilia do Pe. Fantico Borges, CM – Domingo de Ramos – Ano B


Homilia do Pe. Fantico Borges, CM   – Domingo de Ramos – Ano B

A glória de Jesus é fidelidade na Paixão

Com a solene procissão de Ramos e a Paixão de Jesus Cristo a Igreja abre a Semana Santa. O tempo mais intenso na fé da comunidade cristã. No Evangelho (Mc 15, 1-39) vemos que o cortejo organizou-se rapidamente. Jesus faz a sua entrada em Jerusalém, como Messias, montado num burrinho, conforme havia sido profetizado muitos séculos antes (Zac. 9,9). Jesus aceita a homenagem, e quando os fariseus, que também conheciam as profecias, tentaram sufocar aquelas manifestações de fé e alegria, o Senhor disse-lhes: “Eu vos digo, se eles se calarem, as pedras gritarão.” (Lc 19, 40).
Novamente encontramos Jesus quer também entrar triunfante na vida dos homens e mulheres de hoje, não ornado num altar de ouro, nem sentado num trono de riqueza, mas numa montaria humilde, com a simplicidade de um Deus que se fez homem e assumiu nossas dores; que pelo seu sofrimento já não tinha nem aspecto humano.
O senhor carregou sobre seus ombros a cruz que pesava sobre nossas cabeças. Ele preferiu sofrer para não ver sua criação perdida. Por isso, “quem ama os preceitos do Senhor, sujeita com cravos a própria carne, sabendo que, quando seu homem velho estiver com Cristo crucificado na cruz, destruirá a luxúria da carne. Sujeita-a, pois, com cravos e terás destruindo os incentivos ao pecado. Existe um cravo espiritual capaz de sujeitar essa tua carne ao patíbulo da cruz do senhor. Que o temor do Senhor e de seus juízos crucifique esta carne, reduzindo-a à servidão. Porque se essa carne rejeita os cravos do temor do Senhor, indiscutivelmente terá de ouvir: ‘ meu sopro não durará para sempre no homem, visto que é carne.’ Portanto, a menos que esta carne seja cravada à cruz, e se lhe sujeite com os cravos do temor do Senhor nosso, o sopro de Deus não perdurará no homem”  (Santo Ambrósio, comentário ao salmo 118).
No quadro da Paixão de Cristo é preciso vislumbrar nossas paixões diárias. Ninguém nasceu para sofrer, mas a dor nos fez crescer e enxergar o mundo com um olhar mais humilde, simples e limitado. Na Carta Apostólica Salvifici Doloris, o Papa São João Paulo II exortava para a descoberta do sentido salvífico do sofrimento. “O sofrimento humano atingiu o seu vértice na paixão de Cristo; e, ao mesmo tempo, revestiu-se de uma dimensão completamente nova e entrou numa ordem nova: ele foi associado ao amor, àquele amor que cria o bem, tirando-o mesmo do mal, tirando-o por meio do sofrimento, tal como o bem supremo da Redenção do mundo foi tirado na Cruz de Cristo e nela encontra perenemente o seu princípio”. Sempre será um mistério para todos nós tirar do eminente fracasso de uma cruz, uma palavra de Deus para nos animar a caminhar. Carecemos muito de uma visão teológica de nossas vidas. Às vezes, os afazeres da vida contemporânea, a correria diária não deixa tempo para ler o que Deus quis dizer nos acontecimentos dos nossos dias. É preciso parar e olhar a Cruz de Cristo e dizer por Ele sofreu? Porque é também tenho que sofre? O silêncio da Cruz não é ausência de respostar, mas do silêncio da Cruz nasce da vitória.

Novamente Jesus quer fazer-se presente em nós através das circunstâncias do viver humano. Naquele cortejo triunfal, quando Jesus vê a cidade de Jerusalém, chora! Jesus vê como Jerusalém se afunda no pecado, na ignorância e na cegueira. O Senhor vê como virão outros dias que já não serão como estes, um dia de alegria e de salvação, mas de desgraça e ruína. Poucos anos depois a cidade será arrasada. Jesus chora a impenitência de Jerusalém. Como são eloquentes estas lágrimas de Cristo. O Concílio Vaticano II, GS nº 22, diz: “De certo modo, o próprio Filho de Deus se uniu a cada homem pela sua Encarnação. Trabalhou com mãos humanas, pensou com mente humana, amou com coração de homem. Nascido de Maria Virgem fez-se verdadeiramente um de nós, igual a nós em tudo menos no pecado. Cordeiro inocente, mereceu-nos a vida derramando livremente o seu sangue, e n’Ele o próprio Deus nos reconciliou consigo e entre nós mesmos e nos arrancou da escravidão do demônio e do pecado, e assim cada um de nós pode dizer com o Apóstolo: “Ele me amou e se entregou por mim (Gal. 2,20)”.
A história de cada homem é a história da contínua solicitude de Deus para com ele. Cada homem é objeto da predileção do Senhor. Jesus tentou tudo com Jerusalém, e a cidade não quis abrir as portas à misericórdia. É o profundo mistério da liberdade humana, que tem a triste possibilidade de rejeitar a graça divina. Como é que estamos correspondendo às inúmeras instâncias do Espírito Santo para que sejamos santos no meio das nossas tarefas, no nosso ambiente? Quantas vezes em cada dia dizemos sim a Deus e não ao egoísmo à preguiça, a tudo o que significa falta de amor, mesmo em pormenores insignificantes? A entrada triunfal de Jesus foi bastante efêmera para muitos. Os ramos verdes murcharam rapidamente. O hosana entusiástico transformou-se, cinco dias mais tarde, num grito furioso: Crucifica-o! Por que foi tão brusca a mudança, por que tanta inconsistência? São Bernardo comenta: “Como eram diferentes umas vozes e outras! Fora, fora, crucifica-o e bendito o que vem em nome do Senhor, Hosana nas alturas! Como são diferentes as vozes que agora o aclamam Rei de Israel e dentro de poucos dias dirão: Não temos outro rei além de César! Como são diferentes os ramos verdes e a Cruz, as flores e os espinhos! Àquele a quem antes estendiam as próprias vestes, dali a pouco o despojam das suas e lançam a sorte sobres elas.”
Essas cenas da liturgia da palavra de hoje da entrada triunfal de Jesus em Jerusalém e dos gritos enlouquecidos da multidão pedindo sua crucificação pede-nos coerência e perseverança, aprofundamento da nossa fidelidade, para que os nossos propósitos não sejam luz que brilha momentaneamente e logo se apaga. Dentro do nosso coração, há profundos contrastes: somos capazes do melhor gesto para alguns e do pior para outros. Se queremos ter em nós a vida divina, triunfar com Cristo, temos de ser constantes e matar pela penitência o que nos afasta de Deus e nos impede de acompanhar o Senhor até a Cruz.
Que esta semana santa que iniciamos seja repleta de reflexões e desejo de conversão. Peça a Deus que esta semana santa de 2018 seja diferente. Renuncie os passeios, as redes de balanço, as casas de praias, as piscinas refrescantes, aos banquetes regados a vinhos e peixe. Estes dias, e especialmente na sexta, são dias de rezar com Cristo sua Paixão, que é nossa também. Participe de todos os atos do tríduo pascal em sua Paróquia ou comunidade. Deus te livre que na hora da agonia de Jesus você esteja numa rede ou numa cama dormindo, ou bebendo aquele vinho. Deus te livre dessa infâmia. Nosso Senhor te espera na sua Paixão!

Pe. Fantico Borges, CM




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