Homilia do Padre Fantico Borges, CM
Quaresma caminho de conversão pessoal.
Quero começar minha reflexão para esta quata-feira
de Cinzas lembrando de São Leão Magno que dizia: “ Sabendo, porém, que chegaram
os dias santos da quaresma, cuja observância perdoa todas as faltas passadas,
apaga todas as negligências”. Com esta frase desejo lembra-los que a quaresma é
tempo para recomeçar.
A quaresma é um itinerário espiritual onde somos
convocados a contemplar o Mistério da Cruz, fazendo o caminho do calvário, rumo
a ressurreição. Para realizar uma conversão profunda da nossa vida: deixar-se
transformar pela ação do Espírito Santo, como São Paulo no caminho de Damasco;
orientar com decisão a nossa existência segundo a vontade de Deus; libertar-nos
do nosso egoísmo, superando o instinto de domínio sobre os outros e abrindo-nos
à caridade de Cristo; são os meios de por em marcha essa conversão. Novamente
vem me minha memoria as palavras do Papa São Leão Magno: “...não prevaleceremos
sobre nossos inimigos se não prevalecermos, antes, sobre nós mesmos.” Muitos
combates começam dentro de nós, os desejos; as paixões do corpo; o anelo de
controlar as pessoas e o poder, dentre outros, mostram que o inimigo não mora
muito longe de nós. Por isso, o período quaresmal é momento favorável para
reconhecer a nossa debilidade, acolher, com uma sincera revisão de vida, a
graça renovadora do Sacramento da Penitência e caminhar com decisão para
Cristo.
O primeiro passo deste itinerário é contemplar o
Mistério da Cruz. Olhar com profundidade o Silêncio penetrante e salvífico da
Cruz. No “Silêncio da Cruz de Cristo, nasce a certeza da nossa vitória”. Todos
os exercícios quaresmais: jejum, esmola, oração e tantos outros nascem, recebem
e se nutrem da forca da Cruz de Jesus. A prova disso é que recebemos do
Mistério da Cruz a força para unir-nos à mesma Cruz, ou seja, aquilo que Deus
nos pede, ele nos concede: Deus pede que rezemos, Ele nos dá a graça da oração.
Deus nos pede que façamos penitência, Ele nos dá a graça para realizá-la. Deus
pede que partilhemos e que não sejamos egoístas, Ele nos dá a graça da
generosidade e da esmola. Não podemos mais confiar nas nossas próprias forças!
A experiência grita aos nossos ouvidos: “somente com as próprias forças não é
possível!” E é assim. Mas também é verdade aquele grito celestial: com a graça
de Deus, tudo é possível! S. Paulo experimentou e expressou essa realidade de
uma maneira maravilhosa, confiando na graça de Deus pôde dizer aquelas palavras
aparentemente contraditórias: “quando eu sou fraco, então, é que sou forte” (2
Cor 12,10).
O itinerário que a quaresma nos convida a realizar
nasce da consciência que necessitamos de conversão pessoal. São João
Crisóstomo, ensinava que existem distintos e diferentes meios que conduzem a
alma para este fim. Para ele o primeiro era a acusação dos próprios
pecados. Pois se condenamos nós mesmos
aquilo que pecamos esta contrição obterá o perdão diante do Senhor. Condenar
aquilo que se fez de errado, com menos facilidade de recaímos no erro. Por
isso, que quem não faz reta contrição dificilmente alcançará a graça da paz
interior.
Um segundo caminho proposto por São João Crisóstomo
consiste em perdoar as ofensas que recebemos de nossos inimigos, de tal forma
que, colocando limites a nossa ira, esqueçamos as faltas de nossos irmãos. Quem
assim age receberá o perdão de Deus, pois Cristo disse: perdoai nossas faltas
como nós perdoamos a quem nos têm ofendidos.
O segundo caminho é a Oração fervorosa e contínua,
que brota do íntimo do coração. Pela oração a pessoa entra em contato estreito
com Deus, unido-se ao seu mistério de amor. Quem reza vive na presença de Deus
e sabe escutar sua voz, por isso, lhe é mais obediente. Como não existe frutos
sem obediência a oração prepara os corações para confiar somente em Deus e
esperar sempre no seu amor. Pela oração o ser humano caminhas nas sendas de
Deus partilhando do seu mistério de amor, que uni a Santíssima Trindade.
Uma terceira
via é a esmola. Ela possui uma enorme vitalidade, porque abre nosso coração ao
sofrimento alheio e torna-nos mais sensíveis aos apelos de Deus, em favor do
Reino. Ensina-nos, São João Crisóstomo, a esmola nos leva a uma humildade que
significa agir com modéstia, sem desejo de recompensa humana, como fazem os
hipócritas. Neste caminho quem dar recebe mais do que aquele beneficiado. A
esmola ínsita a entrar na vida dos mais frágeis e acudi-los em suas
necessidades, reconhecendo neles o Cristo que sofre. Assim, a esmola dista de uma ajuda
pretenciosa ou interesseira, que buscaria honras pessoais ou reconhecimento de
um ato realizado; ao contrario, a esmola cristã é aquela feita em nome de Deus,
por Ele e n’Ele. Não busca recompensa nem a faz por interesses pessoais, age
apenas por misericórdia.
Neste itinerário quaresmal, que iniciamos hoje
ninguém deixe de esforça-se ao máximo para chegar mais santo na Páscoa. Nas
sendas da graça tudo é possível e quem espera no Senhor sempre alcança. Tomemos
estes quarenta dias como um verdadeiro retiro espiritual, pondo nossa atenção
na oração pessoal, que será nossa vigia, reconciliando-nos com Deus, como ponte
para atravessar as tentações, como mura contra as tribulações, vitória nas
batalhas, sustentáculo do espírito, e desterro da tristeza. Que Maria, mãe de
Jesus e da Igreja caminhe conosco por essa estrada da conversão. Amém
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