Homilia
da Ascensão do Senhor – Ano C
O mistério da Ascensão
Hoje é um dia no
qual se mesclam a alegria pela consumação da glorificação do Senhor Jesus, a
tristeza ao vê-lo partir e a melancolia de uma espécie de sonho quase real. Ao
celebrar a Ascensão do Senhor, celebramos também – como dizia São
Leão Magno num sermão – a exaltação da nossa pobre natureza humana em
Cristo: ele sobe aos céus com a nossa carne, com um coração de carne, com
sentimentos humanos, em fim, ele nos leva aos céus. Santo Agostinho exortava:
“hoje o Senhor nosso, Jesus Cristo, subiu aos céus, suba também o nosso coração
com ele”.
Nós fomos feitos
por Deus e para Deus, levamos dentro de nós essa marca de eternidade que nos
faz desejar a felicidade. Cada ser humano tem dentro de si uma espécie de
saudade do paraíso, um desejo de ser feliz para sempre, uma ânsia de eternidade
que faz sentir certa náusea de viver para sempre numa situação incompleta e
cheia de perigos. Aquela frase de Santo Agostinho, “Fizeste-nos,
Senhor, para ti e o nosso coração está inquieto enquanto não descansar em ti”,
continua atual. A pessoa humana, por mais que queira fugir de Deus, não
descansará enquanto não se deixar seduzir pelo Senhor, já que em cada efêmera
felicidade está buscando a Deus, ainda que as apalpadelas.
Você já desejou,
de verdade, ver Deus? Nós falamos de Deus, cremos nele, o adoramos, é preciso
também desejar vê-lo. Como é o rosto do Pai? Como é a humanidade glorificada de
Cristo? Como é a personalidade do Espírito Santo? O que é Deus? Quem é Deus?
“Ninguém jamais viu Deus. O Filho único, que está no seio do Pai, foi quem o
revelou” (Jo 1,18). Ambas as afirmações estão perfeitamente combinadas na nossa
vida cristã: nós não vimos a Deus, mas nós o conhecemos em Cristo. E, no
entanto, desejamos ver como é Deus, como é cada uma das três Pessoas da
Santíssima Trindade; também queremos dar um abraço em Nossa Senhora e agradecer
pessoalmente ao nosso anjo da guarda por tudo, enfim, nós desejamos o céu.
Hoje é um dia
para desejar a vida eterna. Pode-se ler num delicioso livro publicado pela
Editora Quadrante, Reflexões espirituais, de Salvador Canals, a
conversa de duas pessoas, umas das quais procurava convencer a outra de que a
vida cristã é muito importante. O outro, contudo, se resistia. Depois, num
momento de sinceridade, disse algo surpreendente: “Não posso viver como você
diz por que sou muito ambicioso”. O seu interlocutor teve uma dessas respostas
inteligentes e francas: “Olha, você tem diante um homem que é muito mais
ambicioso que você (…) um homem que quer ser santo. A minha ambição é tão
grande que não ambiciono nenhuma coisa dessa terra (…) Ambiciono a Jesus
Cristo, o Paraíso, e a vida eterna”. Isso sim que é ambição! Todo cristão é um
ambicioso, santamente ambicioso.
Precisamos que a
nossa ambição santa aumente e que desejemos o céu não somente para nós, mas
também para todos os nossos amigos. Um cristão sem zelo apostólico é um cristão
estéril. Assim como não se pode entender que um peixe não possa nadar, a não
ser que esteja morto, assim também não se pode entender que um cristão não seja
apostólico, proselitista (no bom sentido da palavra), a não ser que esteja
morto. Não podemos perder a audácia, o desejo de ganhar a todos para Cristo. No
mesmo sermão citado anteriormente, São Leão Magno dizia que “a fé,
aumentada pela ascensão do Senhor e fortalecida com o dom do Espírito Santo,
não pode temer diante das cadeias, da prisão, do desterro, da fome, do fogo,
das feras nem das torturas dos cruéis perseguidores. Homens e mulheres,
crianças e frágeis donzelas lutaram em todo o mundo por essa fé até o derramamento
do sangue. Esta fé afugenta os demônios, afasta as enfermidades, ressuscita os
mortos”.
Peçamos a Deus
que aumente a nossa fé e, consequentemente, a nossa audácia apostólica, que irá
ao encontro não somente daquelas pessoas que ainda não são católicas, mas
também dos mesmos católicos. Há muitos que estão afastados da Igreja, com uma
fé raquítica, sem vigor apostólico. É preciso ajudá-los! Nessa Semana de Oração
pela Unidade dos cristãos peçamos a Deus que se acabem as divisões, que todos
tenhamos um único desejo: amar a Deus e estender o seu reino por todo o mundo,
cada um no ambiente em que se encontra. É vergonhoso que tantas pessoas levem o
sublime nome de “cristão” e estejam divididos por placas de igrejas e
comunidade eclesiais. Que Deus nos conceda que todos sejamos um sob o cajado do
Sucessor de Pedro, pois essa é a vontade de Deus para a sua Igreja.
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