Homilia do dia de natal 25/12/2015
“Um Menino nasceu para nós: um
Filho nos foi dado! O poder repousa nos seus ombros. Ele será chamado
‘Mensageiro do Conselho de Deus’”. Estas palavras, lidas na leitura da
Missa da Noite, dão bem o sentido da presente celebração. Nasceu para nós um
Menino; foi-nos dado um Filho! Vamos encontrá-lo pobrezinho e frágil, deitado
na manjedoura, alimentado por uma Virgem Mãe, guardado por um pobre
carpinteiro. Mas, quem é este Menino? Quem é este Filho? Agora, com o sol já
claro e alto, podemos enxergar melhor o Mistério: meditemos bem sobre o que
celebramos na noite de ontem para hoje, no que professamos neste dia tão santo!
Este menininho, a Escritura nos diz que ele é a Palavra eterna do Pai: esta
Palavra “no princípio estava com Deus… e a Palavra era Deus”.
Esta Palavra, que dorme agora no presépio, depois de ter mamado, é aquela
Palavra poderosa pela qual tudo que existe foi feito, “e sem ela nada
se fez de tudo que foi feito”. Esta Palavra tão potente, feita tão frágil,
esta Palavra que sempre existiu e que nasceu na madrugada de hoje, esta Palavra
que é Deus, feita agora recém-nascido, é a própria Vida, e esta Vida é a nossa
luz, é a luz de toda humanidade. Fora dela, só há treva confusa e densa! Sim,
fora do Deus feito homem, do Emanuel, não há vida verdadeira! O Autor da Carta
aos Hebreus, na segunda leitura, diz que, após ter falado aos nossos pais de
tantos modos, Deus, agora, falou-nos pessoalmente no seu Filho, “a
quem ele constituiu herdeiro de todas as coisas e pelo qual também criou o
universo”; somente a ele, o Pai disse: “tu és o meu Filho, eu
hoje te gerei!” Por isso, somente eles nos dá o dom da vida do próprio
Deus!
Eis o mistério da festa de hoje: nesta criancinha nascida para nós, Deus
visitou o seu povo, Deus entrou na humanidade. Que mistério tão profundo: ele,
sem deixar de ser Deus, tornou-se homem verdadeiramente. Deus se humanizou!
Veio desposar a nossa condição humana, veio caminhar pelos nossos caminhos,
veio experimentar a dor e a alegria de viver humanamente: amou com um coração
humano, sonhou sonhos humanos, chorou lágrimas humanas, sentiu a angústia
humana… Ele, Filho eterno do Pai, tornou-se filho dos homens para salvar toda a
humanidade, “tornou-se de tal modo um de nós, que nós nos tornamos
eternos!”
Ó criatura humana, por que temes com a vinda do Senhor? Ele não veio para
julgar ninguém. Não nasceu para condenar. Por isso ele apareceu como criancinha
e não como um rei potente; pode ser encontrado na manjedoura, não no trono. Seu
chorinho é doce, não afugenta ninguém. Sua mãe enfeixou seus bracinhos frágeis:
por que ainda temes? Ele não veio armado para punir. Ele está aí franzino para
ficar junto de nós e nos libertar! Celebra, pois, a chegada do teu maior Amigo!
Canta Aquele que foi sempre, no sono e na vigília, esperado e ansiado, o guarda
de Israel, o consolo da humanidade, o alento do nosso coração. Ele chegou,
finalmente! Chegou para nunca mais nos deixar, porque desposou para sempre a
nossa pobre humanidade! São Jerônimo, com palavras cheias de ternura, medita
sobre este mistério: “O Cristo não encontra lugar no Santo dos Santos,
onde o ouro, as pedras preciosas, a seda e a prata reluziam: não, ele não nasce
entre o ouro e as riquezas, mas nasce num estábulo, na lama dos nossos pecados.
Ele nasce num estábulo para reerguer os que jazem no meio do estrume: ‘Ele
retira o pobre do estrume’. Que todos os pobres encontrem nisso consolo! Não havia
outro lugar para o nascimento do Senhor, a não ser um estábulo; um estábulo
onde se achavam amarrados bois e burros! Ah! Se me fosse dado ver este estábulo
onde Deus repousou! Na realidade, pensamos honrar o Cristo retirando o presépio
de palha e substituindo-o por um de prata… Para mim tem mais valor justamente o
que foi retirado: o paganismo merece prata e ouro. A fé cristã merece o
estábulo de palha. Pois bem! Ouvimos a criança choramingar no estábulo:
adoremo-la, todos nós, no dia de hoje. Ergamo-la em nossos braços, adoremos o
Filho de Deus. Um Deus poderoso, que por longo tempo, bradou alto dos céus e
não salvou ninguém: agora choramingou e salvou. A elevação jamais salva; o que
salva é a humildade! O Filho de Deus estava no céu, e não era adorado; desce à
terra e passa a ser adorado. Mantinha sob seu domínio o sol, a lua, os anjos, e
não era adorado; nasce na terra, homem, homem completo, integralmente homem, a
fim de curar a terra inteira. Tudo o que não assumisse de humano, também não
salvaria…”
É este o mistério do Santo Natal! Tenhamos o cuidado de não parar nas
aparências, de não ficarmos somente na meiga cena do Menino, com a Virgem e são
José! Este Menino é o Emanuel, o Deus-conosco! Este Menino veio como sinal de
contradição, pois diante dele ninguém pode ser indiferente: ou se o acolhe, ou
se o rejeita: “A Palavra estava no mundo, e o mundo foi feito por meio
dela, mas o mundo não quis conhece-la. Veio para o que era seu, e os seus não a
acolheram. Mas, a todos os que a acolheram, deram a capacidade de se tornarem
filhos de Deus…” Pois bem: acolhamo-la, a Palavra que se fez Menino, Filho
que nos foi dado! Se o acolhermos de verdade, na pobreza do dia-a-dia, no
esforço de uma vida santa, então poderemos cantar com o salmista: “Cantai
ao Senhor Deus um canto novo, porque ele fez prodígios! O Senhor fez conhecer a
salvação, e às nações, sua justiça. Os confins do universo contemplaram a
salvação do nosso Deus. Aclamai o Senhor Deus, ó terra inteira, alegrai-vos e
exultai!”
Vamos todos! Sejamos testemunhas da graça deste dia, da novidade desta
festa. E cumpram-se em nós as palavras da Escritura na leitura da missa de
hoje: “Como são belos, sobre os montes, os pés do mensageiro que
anuncia a paz, de quem anuncia o bem e prega a salvação e diz a Sião: o teu
Deus reina! O Senhor consolou o seu povo! O Senhor desnudou seu santo braço aos
olhos de todas as nações; todos os confins da terra hão dever a salvação que
vem do nosso Deus”. Sejamos mensageiros dessa paz, dessa boa nova, sejamos
testemunhas do Menino, irradiemos a graça do Santo Natal! Amém.