Homilia da Missa do XXVII domingo
comum ano b. 04/10/2015
O ser humano se realiza
no encontro com outro ser capaz de comunhão com ele.
A narrativa poética de
Gênesis nos desvela que é na mulher que o homem se reconhece a si mesmo: “Desta
vez, sim, é osso dos meus ossos e carne da minha carne! Ela será chamada
“mulher”, porque foi tirada do homem”. Adão descobre o seu companheiro para o
amor: o ser gestado da suas entranhas, nascido do seu coração. Este ser que o
Criador lhe entrega após um longo sono era semelhante a ele, mas diverso. Então
está posta a questão da unidade dual: Homem-mulher. Deus criou o ser humano
nesta unidade-diversidade que ele só se reconhece na diferença do outro que lhe
completa. Aqui na se levanta a questão da defesa do principio heterodoxo da
realidade. A vida é um mistério da diversidade na unidade dos distintos. Isto por que na corporeidade de cada indivíduo
estar a complemetariedade do outro: daí que a solidão é o aniquilamento do ser
humano. É parte ontológica e constitutiva de cada ser humano o encontro
interpessoal. Por isso, dizia Aristóteles, na ética anicômago, que o ser humano
é essencialmente político, ou seja, de relações. No
campo teológico esponsal este Outro é Deus. Em Cristo Esposa a Igreja esposa
esta chamada a fidelidade do matrimônio do mistério nupcial de Cristo com a
Igreja. Assim, é no encontro com o diferente hetero, e não no homo, que o ser
humano se descobre em todas as suas potencialidades.
No evangelho, Jesus não se refere a nenhuma
prescrição da lei, mas retoma a cena da manhã original, não como uma lembrança
do passado, mas como a imagem do paraíso, e, de uma realidade essencial
inserida no coração: “Os dois formarão uma só carne, assim, já não são dois,
mas uma só carne”. O profundo laço que une o homem e a mulher têm, no contexto
do Genesis dois significados: primeiro que o amor conjugal é superior a
qualquer outro laço, mesmo o laço paterno; depois que é tão intimo e tão
profundo que ultrapassa o plano meramente corporal: os dois se tornam uma só
carne! Aqui se afirma a indissolubilidade do vínculo matrimonial. Neste sentido,
a perene natureza do matrimônio, antes de ser uma norma eclesiástica é imperativo
constitutivo do encontro do ser humano com Deus.
O Papa São João Paulo
II, nas suas catequeses sobre o amor humano ensinava: “A esponsalidade do amor
humano é antes um dom do que uma lei”. Como dom ela brota do amor de Deus
derramado na criatura. A questão principal é portanto, saber como reconduzir ao
paraíso do amor e à vontade divina tal como ela se manifestou no princípio.
Jesus nos afirma que a nossa única regra, que resume toda a Lei e os profetas,
é a do amor, tal como existia no paraíso, pois só o seu sopro possui a amplidão
e a infinitude do próprio Deus.
Na sua resposta à
provocação dos fariseus – estritos cumpridores da Lei – Ele faz saber que os
homens e mulheres não são atados em razão de uma vontade humana e não podem ser
separados por esta mesma vontade. Jesus garante que o vínculo entre os que se
amam vem da força de Deus e tem origem divina. Para Ele, são as pessoas,
inundadas e sustentadas pelo sopro divino, que fundam e respondem pelos
esponsais e não os poderes civis e religiosos que os instituem. O amor salva e
as leis que inventamos salvaguardam os direitos adquiridos. Jesus quis e quer
uma humanidade liberada dos constrangimentos, da angústia, da humilhação e dos
sentimentos de culpa. Só a dureza de coração tem necessidade de leis rígidas
que nada têm a ver com as palavras de amor de Deus.
No evangelho, Jesus nos
remete à tradição e nos lembra que o Deus-Esposo não rompe a sua Aliança e nem
repudia o seu Povo-Esposa por não ter sido totalmente fiel ao Seu amor. Para
Cristo o amor dos homens não morre nunca, porque nasce do amor de Deus. Por
isso, o amor do homem e da mulher não caminha para a morte. O divorcio é a
tragédia epopeica do definhamento humano. Daí que a Igreja não aceita o divorcio
e prega a indissolubilidade do vínculo Matrimonial. Mas, não se deve considerar
essa indissolubilidade uma lei e sim um dom. Deus chamou os esposos ao amor, os
chama a viver um amor que não morre, porque cresce cada vez mais e se renova.
Isso significa que o amor matrimonial é chamado a superar as dificuldades
presentes e futuras. Um amor mais forte que os problemas diários. Um amor que
tem a própria força de Deus. E mesmo quando a indissolubilidade do matrimonio
parece perder o sentido, nós encontramos seu sentido mais íntimo na
participação no amor de Cristo crucificado.
Assim como Cristo não
abandonou, mesmo na cruz, sua esposa, a saber, a humanidade, também todo cristão
é convocado a viver dessa fidelidade. O matrimonio contraído no Senhor encontra
força n’Ele para conservar a indissolúvel unidade e comunhão no amor conjugal.
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